O PROJETO

O projeto ReMemorizando tem como objetivo abordar as interações entre Memória social e História. Reconhecendo a memória como um fenômeno social formado pela interação de sujeitos e grupos, o ReMemorizando apresenta estátuas, mitos sobre acontecimentos históricos, personalidades presentes ou apagadas do imaginário popular e a construção de identidades. Sendo assim, o projeto possui como uma de suas principais características a pluralidade, retratando e discutindo a existência de diversas memórias sobre um mesmo acontecimento histórico.


2021

** Black Rio**

O Rememorizando desta semana aborda o Black Rio, movimento musical, político e cultural das periferias cariocas dos anos 60 que buscava a afirmação da identidade negra por meio dos bailes soul.

** Iron Maiden e a Guerra das Malvinas**

No Rememorizando dessa semanas abordamos a relação do Iron Maiden com a Guerra das Malvinas. Quer entender? da o play!

**O Samba e o Rio: história, sociabilidade e resistência **

O Rememorizando dessa semana aborda o Samba e sua origem, não só como gênero musical, mas como espaço de sociabilidade e resistência negra.

** O Nordeste nos Acordes do Rei do Baião**

Neste rememorizando, apresentamos o Baião a partir de uma perspectiva histórica!

** FUNK**

No Rememorizando desta semana vamos falar sobre o funk e sua importância para a cultura brasileira.

** O PADRE CÍCERO**

A religiosidade é um dos aspectos mais importantes da cultura popular no Brasil. Muitas vezes a forma do povo expressar sua fé transcende as próprias estruturas formais da religião. No rememirizando desse semana vamos falar sobre uma das figuras mais importantes dessa religiosidade popular: o Padre Cícero. Considerado como uma figura quase santa por seus seguidores, Padim Ciço como é conhecido desperta até hoje muita curiosidade e admiração.

** O HAITI**

No Rememorizando dessa semana, abordamos a tragédia do Haiti ao longo de sua história até o presente, relacionada à interferências externas, incluindo as do próprio Brasil.

** A REVOLUÇÃO CHINESA**

No dia primeiro de Julho de 2021, o Partido Comunista da China completou 100 anos desde sua fundação, por isso, Rememorizando dessa semana fala sobre a Revolução Chinesa.

** JOÃO DO RIO**

No Rememorizando dessa semana trazemos a história de João do Rio, uma das maiores figuras da literatura carioca. Conhecido por trazer à tona a diversidade do Rio de Janeiro, o cronista e literato é uma das figuras do circuito da diversidade da cidade.

** A COPA DE 1970 **

Futebol e política andam de mãos dadas e, ao contrário do ditado popular, se discutem sim.
O Rememorizando dessa semana revisita a Copa do Mundo de 1970, no México. Nessa o ocasião, houve uma clara interferência do ditador Emílio Garrastazu Médici na seleção brasileira. Além disso, a propaganda em torno do evento foi forte e voltada para um objetivo claro: o fortalecimento do regime militar.

** Chacinas e massacres do Brasil recente **

No Rememorizando dessa semana, abordamos a tragédia social brasileira e um dos seus mais sangrentos sintomas: as chacinas que ocorreram nas décadas recentes em nosso país. Parte de um projeto político predominante no país, os massacres que aqui relembramos representam uma severa política de segurança pública essencialmente racista e pautada na perpetuação da desigualdade social, promovendo violações aos direitos humanos e à própria legislação do país.

** A guerra dos 6 dias **

O rememorizando dessa semana traz como tema a Guerra dos 6 dias, um conflito travado entre Israel e os países Egito, Síria e Jordânia, unidos contra o avanço israelense sobre as terras palestinas, o que viria a acontecer, fortalecendo o Estado de Israel como uma potência na região aliada aos interesses dos países imperialistas.

A SAGA DE AGOTIME

O Rememorizando desta semana aborda a história de Agotime, rainha africana do Reino do Daxomé, trazida para o Brasil como escravizada.

** MOREIRA CÉSAR **

O Rememorizando dessa semana aborda a trajetória militar de Moreira César, o ''Corta-Cabeças'', figura que nomeou importante rua da cidade de Niterói até recentemente.

Bispo do rosário

O Rememorizando da vez apresenta uma importante figura da arte plástica brasileira, que se tornou símbolo da luta antimanicomial e que é, em geral, esquecido na memória popular. Arthur Bispo do Rosário bordou o mundo entre delírios, sonhos e devaneios. Hoje trazemos um exercício de memória sobre sua vida, sua arte e seu legado.

** A greve geral de 1917**

A maior Greve Geral da história do Brasil até então mobilizou milhares de trabalhadores lutando por melhores condições de trabalho. Conheça a Greve de 1917, suas motivações e seu desfecho!

** A construção de Brasília: uma capital planejada **

Hoje temos como normal que Brasil foi feita para ser capital, mas esquecemos como isso é algo incomum e que ela não brotou do chão. Venham conosco rememorizar a criação de Brasília e as mãos que construíram ela.

** SÃO JORGE **

Celebrado em 23 de abril, o dia de São Jorge nos traz diversas manifestações festivas por todo o país. A singular devoção pelo santo guerreiro é um elemento marcante na cultura brasileira. Por isso, a 7 dias de seu feriado, vamos Rememorizar essa figura que atravessa diferentes religiões.

** Arariboia**

O Rememorizando da vez é sobre Araribóia, também reconhecido por seu nome cristão Martim Afonso de Sousa. O indígena foi líder do povo temiminó no litoral fluminense e, lutando ao lado de portugueses pelo domínio da Baía de Guanabara contra a Confederação dos Tamoios e franceses, ascendeu entre os colonizadores portugueses, foi condecorado pelo Reino de Portugal e ganhou terras, onde fundou a vila que se tornaria a cidade de Niterói. Aqui trazemos um panorama sobre essa controversa figura.

Caminho do Peabiru

Você conhece o caminho do Peabiru? Uma trilha indígena milenar que ligava o sul do Brasil ao Peru. O Rememorizando da semana trouxe a história dessa trilha indígena milenar para buscar uma reflexão acerca da riqueza cultural das sociedades pré-colombianas.

** 57 ANOS DO GOLPE **

31 de março foi o aniversário de 57 anos do golpe que inaugurou a ditadura empresarial-militar que durou 21 anos. Venha conosco rememorizar este episódio que infelizmente possui similaridades com os dias de hoje.

A Comuna de Paris

Há 150 anos eclodia a Comuna de Paris, um dos marcos mais relevantes da História no século XIX. Nessa semana, vamos rememorizar a primeira expressão da tomada de poder pela classe trabalhadora.

o 8 de março como Dia Internacional da Mulher

Nessa semana, trazemos à tona o Dia Internacional da Mulher, apresentando suas diferentes fontes de origem e questionando o que ficou consolidado no senso comum ocidental.

O Carnaval da Ressureição: o primeiro carnaval pós gripe espanhola em 1919

O Rememorizando tem um novo formato, agora em vídeo!
Uma breve coleção de imagens que localizamos com o contexto do pós pandemia no começo do século XX para rememorizarmos juntos esse momento catártico na história do Brasil.

2020

HISTÓRIA E MEMÓRIA

A CONSTRUÇÃO DA MEMÓRIA DA ABOLIÇÃO:
EDIFICAÇÕES E ESQUECIMENTO

REPENSANDO A MEMÓRIA SOBRE
GETÚLIO VARGAS

A MEMÓRIA SOBRE OS BANDEIRANTES

REVISITANDO FIGURAS HISTÓRICAS
EMBRANQUECIDAS

MEMÓRIA EM DISPUTA

INDEPENDÊNCIA DO BRASIL

TRADIÇÕES DE SÃO COSME E DAMIÃO:
SINCRETISMO E INTOLERÂNCIA RELIGIOSA

DITADURA MILITAR:
MONUMENTOS E ESQUECIMENTOS

A CONSTRUÇÃO DA MEMÓRIA DE
FRIDA KAHLO

CANGAÇO:
** HERÓIS OU BANDIDOS**

DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA

EM DEFESA DO SUS

REVITALIZAÇÃO OU EXPROPRIAÇÃO?

O JOOGO DO BICHO

AS OCUPAÇÕES ESTUDANTIS

O CENTENÁRIO DE
CLARISSE LISPECTOR

PAULO FREIRE E A EDUCAÇÃO BRASILEIRA

MARIGHELLA

A LEI ANTIFUMO

D. JOÃO VI


O Rememorizando desta semana propõe uma reflexão sobre a memória construída em torno da Família Real Lusitana com o foco em “personagens” que viveram em alguma parte de sua vida na América Portuguesa (Brasil). Iniciando os debates desta semana vamos falar sobre a identidade do D. João VI.Na memória popular a figura do D. João VI se aninhou a figura do “D. Fujão” e "D. Rei por Acaso”, nos filmes e peças teatrais o monarca quase sempre é representado como um soberano guloso, indeciso e medroso. De fato o seu reinado foi resultado de inúmeros acasos, por exemplo, a morte do seu irmão José, sucessor natural do trono, a incapacidade mental da rainha Maria I em governar transformou D. João VI um candidato real ao trono. Por outro lado, ele também fugiu de Portugal por conta das tropas napoleônicas e para o André Luis Bertelli Duarte “essa imagem negativa de D. João começa a ser construída, em Portugal, somente após a “fuga” da corte para o Brasil a partir de um sentimento de orfandade e abandono”. Após da transmutação da coroa portuguesa para o Brasil grupos insatisfeitos com a atitude do monarca fazem uso de suas características e acontecimentos da vida do monarca com intuito de confrontar o regime vigente e ter uma base legitimadora para suas ações.Embora a construção negativa da memória de D. João VI tenha seu início no século XIX, na atualidade essa pratica ainda persiste, um grande exemplo se dá pelo filme: “Carlota Joaquina, Princesa do Brasil". A produção cinematográfica apresenta o D. João VI também como glutão, preguiçoso, medroso e submisso as potencias estrangeiras. Os membros da corte possuem dentes podres, comem suas refeições com as mãos e arrotando. O objetivo de retratar a Coroa Portuguesa desta forma é dessacralizar esses personagens históricos nos dando espaço para promover críticas, no caso da Carla Camurati, diretora do filme, nos ínsita a pensar que “o país nasceu pelas mãos de uma elite corrupta, zelosa de seus próprios interesses, patrimonialistas etc., cujas características ainda definiam o grupo dirigente quase duzentos anos mais tarde” (Bertelli, André, 2018, p.18).Podemos perceber que as mesmas caraterísticas do D. João VI serviram para narrativas completamente distintas; portanto, a personalidade pode ser utilizada para exaltar ou difamar a figura histórica, pois o uso desses símbolos são de acordo com o desejo dos construtores da narrativa, que seguem as questões e discussões presentes em sua temporalidade.

A FAMÍLIA REAL PORTUGUESA


A minissérie “O Quinto dos infernos” teve um grande impacto na memória histórica construída sobre a família real portuguesa e brasileira no tempo presente. Ela foi escrita por Carlos Lombardi e dirigida por Wolf Maia, estreando na Rede Globo de Televisão no começo do ano 2002. O autor utilizou como referência três obras biograficas: O Chalaça de José Roberto Torero; A Imperatriz no Fim do Mundo de Ivani Calado e As Maluquices do Imperador de Paulo Setúbal.Assim que foi lançada, a minissérie sofreu com muitas críticas de diversas esferas da sociedade, como os historiadores, representantes do governo de Portugal da época, grupos conservadores, ufanistas e monarquistas. No entanto, ela fez um grande sucesso com as classes populares, possuindo altas audiências.A partir disso, iremos analisar como foi construída a imagem de Dom Pedro I, Imperatriz Leopoldina e José Bonifácio na minissérie e suas problemáticas.Dom Pedro I, interpretado por Marcos Pasquim, foi representado como um garanhão, viciado em relações sexuais, irresponsável com as questões políticas e que vivia bêbado. Ao mesmo tempo, era carismático, divertido e generoso. Essa representação difere em muitos aspectos do Dom Pedro I histórico, que era um homem hiperativo e que quase não bebia. E, apesar de mulherengo e pouco atento aos estudos, foi importante para o processo de independência, grande defensor da monarquia e um líder autoritário e centralizador, o que causou diversas disputas políticas. Essa veiculação jocosa de Dom Pedro I fez com que sua figura de malandro galanteador fosse bem acolhida pelo público.A Imperatriz Leopoldina, interpretada por Érika Evantini, foi tratada como uma personagem histórica irrelevante, passiva e alheia às questões políticas, enganada por Dom Pedro I, que muitas vezes a ridicularizava como “feia e gorda”. Essa representação demonstra o machismo, que apaga a importância histórica de Leopoldina, visto que ela foi imprescindível para a Independência e a permanência de Dom Pedro no “Dia do Fico”. Ela também era grande incentivadora das artes e das ciências, sendo ainda muito atenta ao jogo político.Por fim, José Bonifácio, representado pelo ator Paulo Goulart, em “O Quinto dos Infernos” seu papel foi muito restrito, sendo veiculado uma imagem autoritária, que fazia muitas críticas a Dom Pedro e implicava com seus romances.Isso fez com que sua figura não fosse apreciada pelo público. Contudo, seu personagem histórico é fundamental, conhecido como “Patrono da Independência”, foi um grande articulador da monarquia, defendia abertamente a abolição da escravidão, conselheiro do Imperador e um dos primeiros a pensar a questão ambiental no País. Ele propôs diversas reformas para o Brasil, que não foram concretizadas devido à discordância das elites econômicas.
Sendo assim, é primordial analisarmos como a memória histórica dessas personagens é forjada, separando o real do ficcional.

D. PEDRO I


A estátua equestre de D. Pedro I, localizada na Praça Tiradentes, no centro do Rio de Janeiro se mostra um monumento muito relevante à história da independência por retratar um dos maiores personagens deste processo. Criado pelo francês Louis Rochet no ano de 1862, a estátua de base quadrangular possui um pedestal com o Imperador em cima de seu cavalo, na intenção de cristalizar o “início” da nação, tanto pelo grito da independência, quanto pela constituição criada na primeira metade do século XIX, empunhada nas mãos do Imperador como se fosse uma espada.O monumento trabalha com outros elementos que permeiam a história do Brasil. Na base da escultura há diversas estátuas de povos nativos de variadas etnias e animais em bronze, representando os principais rios brasileiros: Amazonas, Madeira, Paraná e São Francisco. Esses elementos acabam propiciando a invisibilidade destes povos e consequentemente expondo o seu lugar no que deveria ser a sociedade brasileira, reiterando a violência da colonização e do inter-relacionamento cultural. Dessa forma, os indígenas e a natureza estão em plano de igualdade, cravadas embaixo da estátua, estabelecendo uma relação onde o Imperador com a constituição proclamada estaria acima de todas essas questões.Abaixo da estátua, está escrito: “A D. Pedro I, gratidão dos brasileiros”. Esta frase engendra uma ideia de totalidade do povo brasileiro, no entanto, quem eram os “brasileiros” no século XIX e a quem esta frase se referia? Esta afirmação acaba por excluir as divisões que existiam dentro do território, produzindo o apagamento de indígenas e negros que integravam fortemente a sociedade brasileira.Como um lugar de memória a partir da exposição de diversos elementos do país, a estátua e a Praça Tiradentes são lugares do fortalecimento de um imaginário nacionalista. Os monumentos representam o poder que o Estado possui de agir sobre a memória da nação, governando espaços e saberes, onde a memória do que seria a origem da nação brasileira é posta no centro da cidade, em uma praça pública com grande circulação diária, instituindo sentidos que deveriam ser lembrados e comemorados, como o dia 7 de setembro.

MASSACRE DE ELDORADO DOS CARAJÁS


No dia 17 de Abril de 1996 centenas de famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) realizavam uma marcha até Belém pela desapropriação da Fazenda Macaxeira no município de Curionópolis, sudeste do Pará. Ao chegarem ao ponto da Rodovia PA-150 conhecido como Curva do S, já no município de Eldorado dos Carajás os Sem Terra foram surpreendidos com um ataque violento da Polícia Militar, que resultou na morte de 19 trabalhadores rurais, alguns executados com armas brancas. O Massacre de Eldorado dos Carajás, como ficou conhecido o triste episódio, marcou a sociedade brasileira, demonstrou a urgência da questão agrária no país e tem sido alvo de disputa da memória desde então.Em 7 de Setembro do mesmo ano foi inaugurado no município de Marabá o Monumento Eldorado Memória, em homenagem aos mortos no massacre. Projetado pelo arquiteto de renome mundial Oscar Niemeymer, a obra buscava marcar simbolicamente o processo de violência sofrido pelos Sem Terra e eternizar materialmente a resistência, tendo destaque na obra a frase: “a terra também é nossa”. Da mesma forma que o MST atuou para construir uma memória acerca do massacre, os latifundiários da região reproduziram no campo da memória e da simbologia a violência da chacina em si. No dia 22 de Setembro, um grupo destruiu o Monumento Eldorado Memória com marretas. O ato de vandalismo buscava demarcar com base na violência o poder da classe dominante na região, negando aos movimentos populares o direito à memória.Como forma de reagir à violência patrimonial o MST buscou uma nova simbologia para lidar com o Massacre. Foi construído um novo monumento, desta vez na Curva do S, local do massacre. O Monumento das Castanheiras Mortas de concepção do artista Dan Baron Cohen e construído em forma de mutirão por 800 militantes e apoiadores do MST, foi inaugurado no aniversário de 3 anos da chacina. As 19 castanheiras, que representam o número de mortos no massacre, foram dispostas para formar o mapa do Brasil visto de cima. A escolha das castanheiras não é o ocasional: árvores grandes, a espécie típica da região transmite imponência.O fato dos troncos já estarem em decomposição simboliza que apesar do tempo, a memória das vítimas do massacre permanece de pé, assim como as castanheiras. A resistência das árvores no tempo também é a resistência da luta pela terra, uma vez que todos os anos o MST realiza a jornada de lutas do Abril Vermelho com novas ocupações, marchas e atos e comemora o Dia Internacional da Luta pela Terra em 17 de Abril como forma de lembrar-se do Massacre e de seus mártires.

O MEMORIAL 9 DE NOVEMBRO


Neste ReMemorizando apresentamos o Memorial 9 de Novembro erguido em homenagem aos 3 operários grevistas (William Fernandes Leite, Valmir Freitas Monteiro e Carlos Augusto Barroso) brutalmente assassinados por militares que tentavam aniquilar o movimento grevista dos trabalhadores da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) em 1988. A greve de Volta Redonda é considerada um marco na luta operária brasileira, ocorreu no processo de redemocratização. Contudo, isso não impediu a ação brutal do exército brasileiro para combater o movimento legitimo e assegurado pela constituição.A greve organizada pelos Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda foi declarada a fim de obter a redução da jornada de trabalho para 6 horas, a recontratação dos operários demitidos em greves anteriores, restituição de 26,06% referente à inflação de junho de 1987. A greve foi articulada também com outros setores da sociedade e destaca-se por ter tido um grande apoio da Igreja. Iniciou-se em 07 de novembro de 1988 e durou 17 dias e caracterizou-se por ser uma greve ocupação. A invasão dos militares ocorreu no terceiro dia e não apenas atingiu o território fabril, mas toda a cidade e seus moradores. Depoimentos dados para Comissão da Verdade e para o documentário ““1988 – Uma Greve, Corações e Mentes” declaram que parecia uma guerra, pois o exército não hesitou em utilizar todo o seu aparato militar.A paralisação chegou ao fim com a vitória dos operários que resistiram a violenta repressão militar e tiveram todas as reinvindicações atendidas. No ano seguinte (1989) o novo prefeito eleito pelos moradores encomendou o Memorial 9 de novembro ao renomado arquiteto Oscar Niemeyer em homenagem aos trabalhadores que foram mortos enquanto lutavam pelos seus direitos. Localizado na praça central da cidade, o monumento foi inaugurado no dia do trabalhador e na madrugada sofreu um atentado realizado por forças militares em conjuntos com setores que não apoiavam a greve ocasionando a destruição de boa parte da sua estrutura. Contudo, o prefeito reconhecia a importância do evento para memória da cidade, encomendou uma reforma na qual Niemeyer optou por incorporar os escombros do monumento anterior.

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MARIELLE FRANCO


Na publicação de encerramento do Re-Memorizando dessa semana iremos falar de Marielle Franco, quem era, seu trágico assassinato e sua memória.
Como já repetimos antes neste projeto, a memória é algo socialmente construído, cercado por interesses e um campo de disputas. E infelizmente não foi diferente acerca de Marielle.
Cria da Maré, como a mesma se dizia, iniciou seu ativismo pelos direitos humanos após uma amiga ter sido atingida fatalmente durante uma troca de tiros envolvendo traficantes e policiais. Sua atuação contra a polícia militar e a guerra às drogas marcam sua vida acadêmica e sua atuação política.Em seu mestrado na UFF Marielle fez um estudo sobre as UPPs e como elas eram uma manifestação do Estado Penal presente no Brasil. Atuou também como Coordenadora da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da ALERJ, onde denunciou abusos da Polícia Militar nas periferias e auxiliou as vítimas da violência policial no rio, fossem elas civis, ou integrantes das forças policiais. Mais tarde ela veio a se tornar relatora da Intervenção Militar no Rio de Janeiro.Marielle também foi uma incansável defensora das causas LGBTs, sendo ela própria bissexual assumida desde seus 19 anos. Marielle encarnava suas causas e foi uma guerreira incansável pela igualdade. “Uma sobe e puxa a outra”, segundo Dani Monteiro Marielle foi uma inspiração, que através de sua atuação política puxou muitas outras.
Em 14 de março de 2018 Mariele Franco e o motorista Anderson Gomes foram assassinados na região central do Rio de Janeiro. O carro onde Marielle e Anderson estavam foi atingido por 13 tiros.
A morte da política e ativista teve grande repercussão e gerou comoção internacional. Ocorreram homenagens por todo o país e houveram muitas demonstrações de solidariedade a sua esposa.Após sua morte houveram ataques a sua integridade como pessoa principalmente durante as campanhas para governo do Rio de Janeiro. Atacaram sua memória quebraram a placa da Rua Marielle Franco que foi colocado no lugar da Floriano Peixoto.Em resposta uma série de manifestações estouraram usando e seu nome como símbolo.

LIMA BARRETO


Rio de Janeiro, 18 de agosto de 1914, Hospício Nacional dos Alienados. No prontuário registra-se: branco, 33 anos, solteiro, brasileiro, empregado público. Diagnóstico: alcoolismo. Abaixo uma foto que contradiz a informação sobre sua cor.A ficha médica refere-se a Affonso de Henriques de Lima Barreto. Nascido no dia 13 de maio de 1881, o célebre escritor de "O Triste Fim de Policarpo Quaresma" é uma das figuras mais importantes da literatura brasileira. Hoje o ReMemorizando destaca aspectos fundamentais de sua vida e obra que nos revelam a dinamica racial no Brasil e, discute o processo de embranquecimento de sua memória.Mais do que um perspicaz escritor com seu estilo simples e objetivo de contar histórias, Lima Barreto foi um homem crítico às mazelas sociais promovidas pela escravidão. Lima criticava duramente as teorias eugenistas de superioridade racial importadas da Europa para o Brasil, anunciando o perigo da disseminação dessas ideias em um país profundamente marcado pela escravidão. Por seu olhar refinado para o reconhecimento do racismo estrutural, Lima Barreto ousou contestar as reformas urbanas de Pereira Passos, pois via nesse projeto o drama que sofreria a população mais pobre, expulsa de seus cortiços para que se realizasse as obras no centro do Rio.A utilização da determinação "branco" na ficha médica de Lima Barreto denuncia mais do que um grave erro cognitivo, é também a expressão de um silenciamento. Não reconhece-lo como homem negro é, portanto, negar sua imensa contribuição para a cultura brasileira. O embranquecimento é um processo essencialmente racista pelo qual importantes personagens da nossa história já passaram. Ele é um método que apaga o protagonismo do negro nos processos históricos. Contesta-lo é, portanto, reivindicar o compromisso com a verdade e sobretudo, expurgar o olhar racista sobre a construção das narrativas. Referir-se a Lima Barreto de maneira que não expresse o que ele foi -homem negro, escritor, cronista e jornalista- esconde fundamentalmente sua obra, que é tão marcada pela experiencia de ser negro no Brasil.

MACHADO DE ASSIS


Quando falamos do embranquecimento de figuras históricas, é quase impossível não lembrarmos de Machado de Assis, um dos principais nomes citados ao estudar esse processo de silenciamento. Neto de escravos alforriados e nascido no morro do Livramento, na Saúde, em 1839, Joaquim Maria Machado de Assis se tornou o nome mais importante da literatura brasileira.Em 1908, a morte do escritor deu origem a um flagrante desse processo; “branco”, constava em seu atestado de óbito. Simone da Conceição Silva, cientista social formada na UFF, expõe o fato em sua monografia como bastante significativo para o debate, considerando-se que a obrigatoriedade em especificar a cor nos documentos fúnebres só foi estabelecida 75 anos mais tarde. Na época, início do século XX, as teorias racistas diziam que o corpo negro era adaptado unicamente ao trabalho manual, portanto, seria insuportável para a elite intelectual brasileira admitir que o maior nome das letras nacionais era um homem negro. Dessa forma, sua ascendência e origem foram suprimidas por muito tempo de sua memória. “Do morto de ontem não se precisa fazer biografia.”, escreveu um articulista do jornal “Gazeta de Notícias”.A comum imagem do escritor por volta dos 60 anos, elegante, fino, bem vestido, cabelos ondulados, brilhantes, pele embranquecida, e que, não tem compromisso nenhum com a verdade, vem sendo questionada há algum tempo. Uma foto encontrada pelo pesquisador Felipe Rissato, publicada em uma revista Argentina no ano de 1908, mostrava Machado com traços nitidamente negros. Para Eduardo de Assis Duarte, pesquisador e coordenador do portal da literatura afro-brasileira da Universidade Federal de Minas Gerais, não é uma coincidência um dos poucos registros em que o escritor aparece com seus traços negros, ter sido publicado fora do Brasil, indicando prováveis retoques nas imagens de Machado publicadas aqui.

OS BANDEIRANTES


O ReMemorizando desta semana propõe um debate acerca dos bandeirantes. Essas figuras, muito importantes para a História do Brasil, sobretudo no que hoje compreende a região Sudeste, eram responsáveis pela captura de indígenas. Também conhecidos como “capitães do mato”, adentravam os sertões da colônia, por vezes em missões oficiais de Estado ou mesmo em contratações particulares, fortemente armados para aprisionar índios ou capturar os fugitivos. Esses povos nativos eram vendidos e escravizados.O bandeirantismo foi consagrado pelo imaginário popular, principalmente paulistano, como o movimento responsável pela expansão das fronteiras para além do Tratado de Tordesilhas e pela consolidação do território. De fato, os sertanistas em suas expedições adentraram o território, que ainda estava muito concentrado na faixa litoral, e foram primordiais para a consolidação dele.No entanto, essas missões também atacaram centenas de aldeias indígenas, mataram inúmeros nativos e levaram grande parte de volta para serem escravizados. As bandeiras contribuíram para a manutenção de um sistema escravista, baseado no índio, que perdurou por quase dois séculos na região Sul e Sudeste do Brasil.Nossa proposta é debater a memória popular em torno desses personagens através de monumentos e instituições em sua homenagem. Abordaremos nomes importantes do bandeirantismo, como Borba Gato e Raposo Tavares, adentrando questões importantes sobre seus feitos. Por fim, gostaríamos de entender a relação entre sua representação no imaginário popular e o que eles realmente representam, abordando diversas narrativas.

O BANDEIRANTISMO


Dando continuidade ao tema da semana, o post do ReMemorizando de hoje propõe uma reflexão acerca da construção da narrativa do bandeirantismo na primeira metade do século XX pela historiografia paulista, buscando questionar a mitologia em torno desses personagens.Em fins do século XIX e início do XX, o Estado de São Paulo ganha enorme projeção econômica devido à expansão da cafeicultura, se tornando também o principal polo industrial do país. No entanto, ainda ocupava uma posição política secundária.A historiografia brasileira tradicional até fins do século XIX havia sido escrita pelo IHGB, no Rio de Janeiro. Setores da elite intelectual paulista buscaram disputar a narrativa histórica do país construindo uma mitologia dos bandeirantes ao ressaltar seus aspectos positivos relacionando-os aos ideais de progresso, desenvolvimento, individualismo e civilidade da elite burguesa paulista.A proposta do ReMemorizando é sublinhar que o processo de apropriação e ressignificação do passado se insere dentro de disputas sociais e políticas mais amplas e deve sempre ser questionado e debatido.

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MANUEL BORBA GATO


Localizada no bairro de Santo Amaro, na cidade de São Paulo, está a enorme estátua de Manuel Borba Gato, um dos mais conhecidos atores do movimento bandeirantista. O #ReMemorizando de hoje buscará refletir acerca desta personalidade histórica e das polêmicas que permeiam este monumento.Inaugurada em 1957, a estátua de 10 metros já sofreu diversos ataques de protestos e tentativas de derrubada – legais e ilegais. Sendo a imagem de Borba Gato objeto fundamental na luta pela construção de memória dos bandeirantes, as controvérsias ao monumento são inevitáveis. Enquanto o estado de São Paulo historicamente projeta a ideia de uma figura de liderança, coragem e pioneirismo; existe resistência de diversos setores sociais que buscam expor a verdadeira face de Borba Gato: um dos maiores responsáveis pelo genocídio e escravização da população Guaraní.Vale ressaltar que além desta estátua, Borba Gato nomeia na região de São Paulo ruas, bares, estações de metrô, escolas, etc.Em 2020, com a explosão de movimentos antirracistas Brasil à fora que trouxeram como pauta a ressignificação de figuras historicamente tratadas como heróis, mais uma vez a retirada do monumento de Borba Gato esteve em voga. A luta pela narrativa histórica é constante e o assunto continua a ser debatido. Fato é que Manuel de Borba Gato certamente não é uma figura merecedora de exaltação.

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**GETÚLIO VARGAS **


O ReMemorizando apresenta nessa semana uma reflexão sobre a memória construída entorno de Getúlio Vargas, homem que foi presidente do Brasil entre os anos de 1930 e 1945 e também entre 1951 e 1954, ocupando o cargo executivo mais alto do país por 18 anos e meio, sendo 8 deles sob regime ditatorial e apenas a última passagem sendo viabilizada por eleições diretas.Procuramos aqui questionar a consolidação de uma interpretação positiva entorno do político, observando que sua trajetória, anexada à história do Brasil, apresenta controvérsias profundas que por vezes são ignoradas diante de sua exaltação institucional e popular. Os governos de Getúlio Vargas promoveram políticas que foram cruciais para o país positivamente, mas ao mesmo tempo não podemos deixar de lado que por 8 anos, sob liderança do mesmo, o Brasil esteve mergulhado em um regime ditatorial que promoveu intensas perseguições políticas e práticas extremamente autoritárias; a ditadura do Estado Novo, que perdurou entre 1937 e 1945, tinha a marca pessoal de Vargas. Tal período ditatorial pouco é mencionado dessa forma fora do campo historiográfico, cabendo na memória popular muito mais pelas realizações positivas aos trabalhadores efetuadas no período do que propriamente por sua complexidade política. Essa memória positiva parte também do próprio trabalho dos governos de Vargas, sobretudo de sua ditadura, onde construiu-se intensamente sua imagem de bem feitor máximo, colocando-o como figura paternal para o povo.A figura de Getúlio Vargas é extensamente exaltada por todo o país, entre logradouros, estátuas, edifícios públicos e praças. Pouco é lembrado pelo Estado brasileiro e popularmente das práticas autoritárias do velho presidente; a memória daqueles que sofreram com as perseguições é em maior parte restrita à academia. Nesse mesmo sentido, até hoje ainda vemos a exaltação de Vargas como referência para políticos brasileiros postulantes aos mais variados cargos. Nesse sentido, questionamos aqui a exaltação ao velho político que perpetuou-se no imaginário político nacional e está marcado de maneira positiva para o povo brasileiro.

**AV. PRESIDENTE VARGAS **


Dando continuidade ao projeto Rememorizando, o PET História UFF pretende fazer uma reflexão sobre a memória do Getúlio Vargas problematizando a construção da Avenida Getúlio Vargas localizada na cidade do Rio de Janeiro, o intuito do texto se caracteriza em discutir e marcar pontos que contribuíram para a formação da memória acerca da figura do Getúlio Vargas.A idealização da Avenida começou em 1938 na gestão do prefeito Henrique Dodsworth e foi concluída no ano de 1942, o projeto se postulava como a solução para melhorar a mobilidade urbana, ligando o centro da cidade com a Zona Norte, para cumprir o planejamento foi colocado abaixo a Praça XI reduto dos antigos carnavais, as igrejas de São Domingos, São Pedro dos Clérigos, Nossa Senhora do Calvário, Bom Jesus (todas construídas no período colonial), além de um grande número de casas.Na mente dos dirigentes do Estado a transformação urbana iria além da construção da rodovia propriamente dita, mas implicitamente as ruas largas e grandiosas significam naquele momento o ápice da modernidade e progresso, logo "no contexto urbano brasileiro e carioca, o uso da palavra avenida se associa menos à sua concepção formal – como alameda ou bulevar – do que ao traço projetual que conduzirá a cidade a uma nova etapa do projeto moderno" (Andrea de Larceda, 2006, p. 136).Nessas circunstâncias a transformação urbana cumpre o papel de romper com o passado, por isso a narrativa estatal desenvolvida e reforçada pela grande quantidade de propagandas, se torna extremamente positiva, enquanto as perspectivas dos moradores, religiosos e foliões são relegados ao esquecimento.O importante pensar aqui, é o processo da construção da memória de Getúlio Vargas, ou seja, ele ao direcionar qualidades a obra está automaticamente atribuindo esses valores para si mesmo, pelo outro lado, ao deixar implícito o autoritarismo do processo faz com que essa característica não seja agregada ao seu regime, a construção da Avenida Presidente Vargas nos demonstra como o Estado Novo agia para moldar uma memória popular positiva em torno da governabilidade, portanto ditando assim os valores e discursos aceitos e não aceitos no “novo Brasil”.

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MEMÓRIA POPULAR


O post do ReMemorizando de hoje vai discutir a memória de Vargas, que como vimos governou maior parte do tempo sob um regime ditatorial, e a memória da Ditadura Militar, que teve início com o Golpe de 1964.Apesar do consenso na historiografia em relação ao caráter ditatorial do regime iniciado em 1964, e às atrocidades e violências cometidas nesse período, a memória da Ditadura Militar ainda está em disputa. É possível ver um ressurgimento de memórias positivas e saudosistas em relação a esse regime, inclusive, com o pedido de uma nova intervenção militar por parte de alguns grupos.Porém, mesmo nesse contexto de disputa de memória, vemos outros grupos problematizarem as ruas e avenidas que possuem nomes de ditadores e envolvidos na ditadura militar. Em algumas cidades, inclusive, há projetos e ações que visam alterar os nomes de ruas que homenageam esses militares que violaram os direitos humanos.Em relação a outra ditadura que marcou a História do Brasil, o Estado Novo de Vargas, não vemos uma disputa de memória tão conflituosa ou um questionamento expressivo de monumentos/ ruas que o homenageam. Apesar de historiadores concordarem que tratou-se de um governo ditatorial, que cometeu diversas violações, ainda há uma memória mais positiva na sociedade em geral. Muitas pessoas, inclusive, não o veem como um ditador.Alguns fatores podem ser importantes pra entender essa diferença, como o fato da ditadura militar fazer parte de uma História mais recente do país, uma ferida ainda aberta. Além disso, Vargas teve um governo democrático (1951- 1954) e uma base popular forte, construída a partir de políticas voltadas aos trabalhadores. Tudo isso pode contribuir para que haja essa diferença em relação as memórias construídas sobre esses dois períodos e o nível de questionamento que fazemos deles hoje.

PRINCESA ISABEL


A primeira edição do projeto “Re-Memorizando” apresenta a análise da estátua da Princesa Isabel. Inaugurada na dia 13 de maio de 2003 e localizada em uma avenida em Copacabana que também recebe o nome da princesa, a estátua tem como objetivo homenagear a monarca e celebrar a abolição da escravidão brasileira. O monumento compõem uma narrativa dentro do espaço urbano que é composta “a partir da referência alegórica ao espaço e ao tempo da ação histórica tematizada pela escultura”, segundo o historiador Paulo Knauss. A escultura monumental da Princesa Isabel está situada no centro de um cruzamento, sendo assim, endossa uma perspectiva clássica (o centralismo) e denota poder e integração com todo o espaço e tempo urbano. Além disso, a obra relaciona-se diretamente com a História e a Memória Social,
refletindo um processo histórico perpassado pelo imaginário urbano e naturalizado pela lógica espacial e seus habitantes.
Sendo assim, é importante ressaltar que a renomeação da Avenida em 1949 endossa o processo de construção de uma narrativa histórica voltada para estabelecer determinados heróis da abolição. A construção da estátua 54 anos depois deste fato e sua inauguração no aniversário da Lei Áurea reforça e simboliza a continuidade de um discurso histórico salvacionista que caracteriza a Princesa Isabel como a redentora. O monumento encontra-se posicionado entre os bairros do Leme e Copacabana, áreas nobres do Rio de Janeiro, tidas como cartões postais da cidade. A monarca encontra-se em um pedestal voltada para o Atlântico assumindo um tom de liberdade, mas também relembra o exílio presente na história de vida da princesa. A Avenida e o monumento conectam-se com o restante do espaço urbano carioca e corroboram com uma história política ocupada apenas pelas classe dominante. Coincidência ou não, estão localizadas no extremo oposto da rua nomeada Joaquim Nabuco, um importante abolicionista.A instalação do monumento da Princesa Isabel em 2003 tem ainda uma questão relevante a ser levantada, pois ela se dá no mesmo ano que ocorre a aprovação da Lei 10639/03, que torna obrigatório o ensino de história da África e dos africanos no Brasil. Esses dois fatos podem parecer desconexos a primeira vista, embora não o sejam. A aprovação da lei é o resultado da atuação de movimentos sociais que compreendem atuação negra na luta pelos seus direitos e sua liberdade e se vêem como agentes históricos. Essa mudança da compreensão de sua história é também um paradigma memorial diferente daquele manifesto na narrativa afirmada pela estátua e dominante na época.A memória da abolição como algo vindo de cima, proclamado por uma representante das classes dominantes (a Princesa Isabel) é ainda hoje corrente e tem seu nascimento já em sua época. Os jornais da época celebravam o fato com seu nome em destaque, muitos manuais escolares e livros didáticos repetiram essa narrativa e podemos escutar o reverberar dessa memória cem anos depois no enredo de 1989 da Imperatriz Leopoldinense. Mas por que dessa ser uma memória tão problemática?
Essa é uma pergunta simples com uma resposta complexa. Como dissemos na postagem anterior a memória também é constituída de apagamentos. Ao colocarmos a Princesa Isabel como símbolo do fim da escravidão ignoramos outras figuras centrais para a queda do sistema escravocrata no Brasil e ignoramos um longo processo que se deu ao custo de muitas vidas negras.
Lembrar da abolição através da "Isabel, a heroína. Que assinou a lei divina" é por em segundo plano um processo que atravessou séculos com o enfraquecimento da instituição escravocrata através da formação de quilombos, como o dos Palmares e o do Quariterê; ou as fugas de cativos perpetradas pelos Caifazes; ignoramos a rebelião de Dragão do Mar que acabou por levar ao fim da escravidão no Ceará, anos antes da Lei Áurea ser aprovada.
Enxergar o fim da escravidão no Brasil como um processo longo e repleto de lutas e disputas, com múltiplos agentes históricos e protagonizado pela própria população negra não gera um demérito a figura da Princesa Isabel, ela continua a ser abolicionista, sua ação junto a grupos parlamentares para a aprovação da Lei do Sexagenário e pela aprovação da Lei Áurea, bem como ativismo em associações ainda será lembrada, mas é inegável que a memória construída e vigente dela e da abolição precisam ser repensadas.

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LUIZ GAMA


O monumento é um marco que estabelece uma narrativa no espaço urbano. Portanto, as escolhas de figuras que serão retratadas não é desintencionada, elas explicitam uma escolha do que lembrar e do que esquecer. Em 1931 houve a inauguração de um busto de Luiz Gama no Largo do Arouche, uma iniciativa da imprensa negra que encontrou resistência ávida da prefeitura de São Paulo o que resultou em um atraso de 17 meses.Luiz Gama é uma das figuras da história que devem ser aderidas ao imaginário popular e à memória coletiva brasileira. Filho de Luiza Mahin, uma líder da revolta escrava dos Malês e integrante de revoltas populares, nasceu livre e foi vendido como escravo pelo pai. Fugiu do cativeiro aos 18 e provou perante a lei que era livre. Culto e ávido leitor, tentou participar da faculdade de direito como ouvinte, mas foi impedido pela elite paulista. O que não o impediu de se tornar rábula e garantir seu lugar no campo jurídico. Atuou ativamente para a abolição das mais diversas formas. Foi escritor em periódicos políticos, foi o diretor da principal associação abolicionista de São Paulo e através da arrecadação de recursos e luta jurídica libertou mais de 500 escravizados. Poeta, intelectual e ativista. Em seu cortejo fúnebre estiveram presentes 3 mil pessoas numa época em que a população não passava de 100 mil.O marco é de extrema importância pois há um recorrente apagamento do envolvimento ativo de negros no processo de abolição. Gostamos de varrer para baixo do tapete não apenas seus atos de resistência popular, como apagamos ou embranquecemos seus intelectuais. Por isso o Re-Memorizando escolhe trazer a tona essa figura pouco falada e ressalta o monumento em sua homenagem. O movimento abolicionista em sua maioria das vezes é posto como algo suspenso e afastado das “massas passivas de escravizados”, quando em geral é na verdade uma recorte mal intencionado. Escravizados e negros integravam ativamente o movimento abolicionista e tiveram figuras que atuaram como intelectuais e dirigentes políticos.

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HISTÓRIA E MEMÓRIA


Antes de começarmos de fato o ReMemorizando, achamos importante falarmos um pouco sobre as interações entre Memória e História. Deste modo, é necessário definir as duas categorias, entender suas relações de influência e processos de construção.Erroneamente considerada estática e referente apenas ao passado coletivo e individual, a memória é constituída através relação do passado, futuro e presente além de estar em constante transformação e ser influenciada pelos interesses daqueles que detém o poder. De acordo com o historiador José d'Assunção Barros “devemos pensar na Memória como instância criativa, como uma forma de produção simbólica, como dimensão fundamental que institui identidades e com isto assegura a permanência de grupos.. Sendo assim, a memória se constituiu como um domínio dinâmico, simbólico e político perpassado por lembranças e esquecimentos em movimento dialético que formula os sujeitos dentro da sociedade e no tempo histórico.Ao ser compreendida como produto da social, a memória torna-se objeto da História. É importante ter em mente de forma clara que a memória, enquanto um fenômeno social, é ditada pelas demandas do presente, sendo impossível resgatar uma memória "pura" ou "verdadeira". O caráter social da memória também nos mostra que ela é resultado da interação de agentes sociais, sendo diferente entre os diferentes grupos, um mesmo fenômeno pode ter diversas memórias.A memória social é um corpo ideológico, gerado por um coletivo que possui uma memória aproximada, essa memória gera unidade e reconhecimento e com frequência faz parte da formação da identidade desse coletivo. Por seu potencial apaziguador, frequentemente grupos dominantes investem na formação e manutenção da memória em questão. Formas de reavivar essas memórias são celebrações, monumentos, manutenção de acervos e outras políticas. E aqui nos deparamos com um outro tópico relevante, os locais de memória, que segundo Ulpiano Menezes pode ser uma edificação, um local de fato, um item originado na época referida. Esses locais recebem seu significado de acordo com as demandas do presente, como por exemplo uma arma de um guerreiro, a sua época ela poderia ser apenas um instrumento de ofício, porém hoje ela é incumbida do valor de um resquício de um passado heróico no qual esse povo enfrentou seu algoz e simboliza a bravura inata aquela população.A relação entre memória e história é, em poucas palavras, complicada. De certa maneira a memória é uma fonte para a história e a história não é puramente a memória devido a seu compromisso com a verdade. Entretanto, não podemos negar que há uma relação contraditória entre elas: a história é feita pelas perguntas que fazemos do presente para o passado e provavelmente será guiada por nossas percepções de mundo, em compensação a história como campo do conhecimento auxilia e guia a construção de uma memória social com os temas e acontecimentos que escolhe lembrar ou esquecer. Principalmente quando falamos de história pública, que é uma das principais formas de construção destas memórias sociais, é de muita importância se atentar para quais agentes e fatos escolhemos prestar homenagens com monumentos e quais narrativas estamos escolhendo reiterar por meio destes monumentos.

TRADIÇÕES

**DISTRIBUIÇÃO DE DOCES ÀS CRIANÇAS **


O culto aos santos católicos Cosme e Damião está presente desde o início da formação do Brasil. A primeira igreja em homenagem aos irmãos foi construída já em 1535, em Igarassu - Pernambuco e permanece em atividade até hoje. A associação dessas figuras com outras das religiões africanas foi explicada no post anterior e representa um aspecto muito importante dessa data: o sincretismo religioso, ou seja, práticas religiosas que advém da fusão de outras práticas de religiões diferentes. As tradições do Dia de São Cosme e Damião, 27 de setembro, também são repletas de encontros entre o Catolicismo e a Umbanda e o Candomblé.Uma prática menos conhecida, mas que é muito popular na Bahia é o Caruru de Cosme e Damião. Nessa festa são preparados o caruru de quiabo e outros práticos típicos da culinária baiana e afro brasileira para celebrar a vida, a cura e as crianças. Tradicionalmente, o banquete é oferecido aos donos da festa (São Cosme e Damião ou ao orixá Ibejis), depois às sete crianças escolhidas para representar os sete irmãos (Cosme, Damião, Doum, Alabá, Crispim, Crispiniano) e só então é servida aos adultos. Às demais crianças são oferecidos doces em sacolas. Essa celebração é típica das religiões de matriz africana, porém ainda guarda traços da tradição católica.A distribuição de doces nas ruas para as crianças é outro costume muito popular da data. Na tradição, Cosme e Damião davam balas às crianças doentes como forma de amenizar a sua dor. Essa prática foi então, absorvida também pelos católicos. É difícil precisar sua origem por conta do forte cunho oral e místico desses costumes, porém o mais importante de entender é o caráter diverso das celebrações, que se encontram, misturam e até divergem no contato entre duas religiões.

**INTOLERÂNCIA RELIGIOSA **


Como vimos anteriormente, a tradição da entrega de doces no dia de São Cosme e Damião é bem antiga e sempre foi muito popular, no entanto, ultimamente vem perdendo força por conta do aumento da intolerância religiosa.Com a crescente onda conservadora e reacionária neopentecostal, alguns adeptos de religiões de matriz africana são perseguidos, tendo seus terreiros destruídos e seus objetos sagrados quebrados, queimados e profanados.Podemos compreender as práticas de intolerância religiosa a partir do mecanismo do racismo estrutural brasileiro, que há seculos é pautado pelo genocídio da população negra, tanto o extermínio físico quanto o simbólico na tentativa de apagar sua cultura, valores e costumes.Vale ressaltar que a Constituição garante a liberdade de crença religiosa como direito fundamental por meio de seu art. 5º, VI, sendo assim (e não poderia ser diferente), também protege a manifestação da cultura afro-brasileira, indígena e popular no art. 215 §1º. A intolerância religiosa é crime e deve ser denunciada!

**50 ANOS DO GOLPE MILITAR **


Para muitos, 2014, foi o ano do centenário da Grande Guerra e, para a maioria desses, passou despercebido o fato de ser o ano quinquagenário do golpe que instaurou a ditadura no Brasil. Exceto por setores explicitamente dedicados a denúncia dos crimes ou grupos que eram engajados com a temática, é inegável que o trauma da guerra europeia foi mais comentado que o da perseguição política nacional.A verdade é que quando tratamos de memória da ditadura, ainda nos posicionamos com muitos pudores. Legado do nosso processo de redemocratização que revestiu toda a ditadura de um caráter conciliativo como que implicitando: “todos os lados estávamos exaltados, então, concordemos em todos eram culpados”. A reabertura política como um todo foi um ato de silenciamento, sua retórica em geral é que não havia porque se falar do passado se o grande desafio era o futuro. O processo como um todo tinha como projeto, se não um apagamento, jogar as piores partes para de baixo do tapete.Não é de surpreender, portanto, que diferente de outras ditaduras e tragédias na história da humanidade, não há um monumento com o nome ou lista de suas vítimas. Primeiro, pois houve uma ação direta para que os documentos quanto aos crimes fossem apagados ou “perdidos”. Segundo, pelo fato do próprio processo de reabertura política ser construído para evitar e, por vezes, negar qualquer construção de memória sobre o terrorismo de estado do Regime Empresarial-Militar, não apenas por sua anistia que perdoou crimes “dos dois lados”, mas pela própria retórica de não deixar o passado ficar no caminho do futuro.Entretanto, recentemente, grupos da sociedade civil estão se mobilizando e cobrando a construção de monumentos apara marcar fisicamente esta memória tão negligenciada. Nosso projeto desta semana se focará nestes monumentos e quais as dificuldades e tensões encontrados pelos grupos que exigem que eles existam.

As contradições na memória de Frida Kahlo


Frida Kahlo foi uma artista mexicana que viveu na primeira metade do século XX e ficou popularmente conhecida após ser incorporada como grande símbolo do Feminismo. É comum encontrarmos, sobretudo na internet, menções a ela como feminista pois rompeu diversos padrões de sua época ao ser uma mulher artista, independente, que assumia sua bissexualidade, e não incorporava os padrões estéticos da época (por isso assumia suas sobrancelhas naturais) e afins.
De fato, Frida é uma figura revolucionária e muito importante para a História, já que hoje ocupa um lugar de referência no mundo artístico, o que mulheres não têm muito espaço. Entretanto, isso não significa necessariamente que ela tenha sido uma ativista pelo direito das mulheres e que a bandeira da emancipação feminina esteja por trás de seu trabalho e de sua história. Essa correlação pode ser considerada um erro anacrônico, visto que, nesse caso, noções da atualidade estão sendo à memória de Frida.
Após sua morte, Frida libertou um diário em que registrar diversas informações íntimas que permitir compreender um pouco mais sobre ela. Nele não há registros que indiquem qualquer tipo de relação ou comprometimento do artista com a luta pela igualdade de gêneros. Além disso, existem leituras de Frida como uma mulher bastante submissa, subserviente e dependente emocionalmente a Diego Rivera, seu cônjuge, com quem viveu um relacionamento conturbado e difícil, mas mesmo assim, desempenhou por bastante tempo um papel estritamente de esposa, explorando pouco seu lado artístico.
Por isso, embora Frida obteve certo envolvimento com movimentos políticos por uma reforma cultural nacionalista, por exemplo, nunca incorporou ao debate o papel das mulheres neste universo. Ela pintava a si, suas dores e fr capaz e talvez, por isso, seu lugar de destaque não devesse ser no âmago do discurso feminista.

Capitalismo e apagamentos na memóra de Frida Kahlo


Como anteriormente, Frida Kahlo tornou-se um grande símbolo do feminismo atual, mais especificamente no aspecto comercial. Não é difícil de encontrar blusas, bolsas, bonecas, fantasias e outros objetos que estampem releituras dos retratos da artista. Além desse fenômeno implicar em um debate muito coerente sobre a problemática na transformação de artistas e suas obras em produtos vendáveis, a apropriação da imagem de Frida também gera algumas distorções em sua memória.
Algumas partes da vida de Frida, que foram muito relevantes em sua história e na construção de sua arte, são convenientemente apagadas de sua memória, como por exemplo o diagnóstico de poliomielite em sua infância, que lhe causou uma lesão no pé. Aos 18 anos, ainda sofreu um grave acidente, e teve que passar por mais de 30 cirurgias. Tornar ao extremo repouso após tantos procedimentos médicos, um artista desenvolvido graves problemas na coluna, sendo obrigada a usar coletes que amenizavam os danos. No entanto, essas fatos são frequentemente esquecidos em suas representações, que muitas vezes mostram uma Frida sem cicatrizes, sem a deficiência no pé e correspondendo a padrões que estão muito distantes de uma Frida verdadeira.
A apropriação de personagens para fins comerciais se torna uma tarefa fácil quando sua memória é construída silenciando os pontos que não são convenientes ao mercado. No caso de Frida, essa prática se torna mais contraditória ainda, ao ser referente a um movimento que, em uma de suas pautas, reivindica uma libertação feminina dos padrões que lhes são impostos.

O apagamento do alinhamento político de Frida Kahlo


Da artista Frida Kahlo muito se sabe a respeito de sua expressão artística, fortemente marcada pela criatividade e irreverência. Contudo, um aspecto fundamental da vida da artista é apagado na maioria das análises de sua biografia. Em vida, Frida Kahlo nunca escondeu seu alinhamento politico com o marxismo e a luta revolucionária. Sua crítica ao imperialismo norte-americano também é tônica forte de seu trabalho.Tendo o contexto do pós Revolução, Frida é um dos principais nomes que colaboraram com a composição de uma identidade politica, social e cultural do México. A contestação da ordem capitalista burguesa, a luta do povo campesino e a interferência dos Estados Unidos na soberania nacional dos países da America Latina, sempre estiveram presentes nos escritos de Frida.“A revolução é a harmonia da forma e da cor e tudo está, e se move, sob uma só lei = a vida =
Ninguém está a parte de ninguém
Ninguém luta por si mesmo
Tudo é tudo e um” 1
Frida viveu de perto a ascensão de um dos movimentos mais emblemáticos do século XX, o muralismo mexicano. Com seu companheiro Diego Rivera, e outros artistas como David Alfaro Siqueiros e Clemente Orozco, Kahlo denuncia as chagas do capitalismo, reforça a luta dos trabalhadores e exalta a identidade indígena.
Apesar de seu estilo intimista ao retratar suas dores físicas e emocionais, a artista também encontrava caminhos para expressar uma luta coletiva dos mexicanos.
Portanto, silenciar a vida política de Frida Kahlo não só empobrece a riqueza de sua obra como também produz imprecisões sobre processos históricos.
“O México é um país que vem sendo feito pelas suas feridas (...). Nossos corpos estão partidos ao meio (...) nascida com a revolução, Frida Kahlo tanto reflete como transcende o evento central do México no século XX. Ela o reflete em suas imagens de sofrimento, destruição, chacina, mutilação, perda, mas também nas imagens de humor e de alegria que tanto marcaram sua vida penosa.”. 2Irreverente, contestadora, revolucionária e marxista.[1] KAHLO, 1995, p. 245.
[2] FUENTES, 1995.

REVITALIZAÇÃO OU EXPROPRIAÇÃO?


A copa de 2014 trouxe, antes de si, uma série de convulsões sociais. A mais famosa sendo as jornadas de julho de 2012 que, por interessante que sejam, acobertaram um outro processo que possui bases mais violentas que os confrontos de rua: a remoção de comunidades inteiras para alocação de um mercado imobiliário que lucraria com os eventos de alcance internacional, com pouca, se não nenhuma, consideração com qual seria o futuro de seus moradores.
É curioso pensar que o que o Brasil exporta em grão ele importa em política heugenista. O que acontece com as comunidades removidas pelas obras de revitalização para as Olimpíadas e para a Copa são parte de um processo que ocorre com certa frequência na história do Rio de Janeiro e da mesma maneira que, no começo do século XX, Pereira Passos se inspirou na Paris da Belle Époque, Eduardo Paes toca um processo muito semelhante a Nova Iorque dos anos 2000 e 2010. Se antes, da França, trouxeram políticas higienistas, agora, dos EUA, trazem políticas gentrificadoras.
Todos constituem um plano de reforma urbana que em sua superfície tem preocupações com o bem-estar da cidade como comunidade, mas trazem em sua base um projeto de segregação social. As políticas higienistas do século XIX/XX buscavam combater a proliferação de doenças e aumentar a salubridade do ambiente urbano. Porém, pouco se perguntaram o que poderiam fazer para que aquelas regiões e seus moradores terem uma condição ou acesso melhor, não por pouco Pereira Passos é conhecido pela política do “bota abaixo” que consistia basicamente em expulsar as pessoas (pobres) de suas moradas (cortiços na época) para abrir espaço para as reformas que julgava necessária, reformas essas que tinham mais haver com circulação de mercadorias e estética que realmente com saúde, uma vez que queriam que o Rio fosse a Paris Tropical. Para além disso, havia uma política de apagamento que buscava reformular as aeras centrais de maneira a modernizá-las cobrindo os vestígios do tráfico de escravos que teria como consequência empurrar para os bairros mais periféricos, pessoas cujos pais e avós haviam sido escravizados. E o Brasil não distorceu nada que antes era bem-intencionado na Europa, o que o Rio fez por medo de sua população de ex-escravizados, a Paris fez por seus trabalhadores pobres que haviam se rebelado em 1870.Agora, um século depois, vemos um movimento semelhante. Buscam se espelhar nos EUA, querem fazer com comunidades daqui o mesmo que fizeram com bairros tipicamente negros e de imigrantes como Brooklyn, Queens e Bronx. Quando antes com a saúde como desculpa, agora vem a estética. Revitalizar a cidade e torná-la menos intimidadora ao comércio e o turismo, com grandes obras para grandes eventos para uma grande cidade. Enquanto as obras com início do século XX vieram de uma vergonha e um remanejamento do passado, as do século XXI vem para montar a base para o mercado imobiliário. Os moradores destas comunidades são removidos compulsoriamente e realocados em moradias da “minha casa minha vida” em áreas entre 40 e 70 quilômetros de distância de suas residências originais ou são forçados a vender suas casas a preços baixos que não possibilitam se estabelecer em regiões próximas devido a especulação (especulação esta que é o motivo pelo qual estão sendo expulsos e em cima da qual as imobiliárias vão faturar). Em poucas palavras: eles então sendo tirados do centro e da zona sul do Rio e sendo levados para a zona oeste, pois se não são levados a força o que receberam por suas casas não se aproxima do necessário para se estabelecer em regiões menos periféricas. Cabe, por último lembrar, que, para além do preço elevado da passagem de transportes públicos, a vias que ligam a zona oeste com as outras foram reduzidas, ilhando essas comunidades.Vemos que, nesta lógica, deixar a cidade melhor significa tirar a população pobre do centro e deixar o “cidadão de bem”. O que antes era para esbanjar civilização, hoje é para garantir um cartão de visitas que possa vende-la. Do mesmo jeito que no século XX não se pensou uma política de inclusão de ex-escravizados no mercado de trabalho, não há preocupação de montar uma verdadeira política pública para melhorar a condição dessas moradias ou de absorção dessa mão de obra. Não importa o que se diga o fim é o mesmo: melhorar a cidade é afastar o pobre dela.Ao longo dos textos, veremos como esses projetos estão afetando comunidades do Rio de Janeiro, como essas pessoas estão reagindo e pelo que estão passando. Teremos estudos de casos para mostra como isso se deu e continua ocorrendo.

O CASO DA FAVELA DA CATACUMBA


O Re-Memorizando desta semana tem como tema central o processo de remoções das favelas ao longo da história. O primeiro caso é a extinta Favela da Catacumba, localizada na região da zona Sul e próxima a Lagoa Rodrigo de Freitas, foi removida em 1969 no mandato do governador do Estado da Guanabara Negrão de Lima e hoje transformou-se no Parque Natural Municipal da Catacumba. A área era pertencente a Baronesa da Lagoa Rodrigo de Freitas que deixou em testamento a terra para os seus ex- escravos. Na década de 20 o Estado interviu no processo e dividiu o terreno em 32 lotes iniciando a apropriação e a construção dos primeiros barracos. Contudo, foi apenas na década de 40, com migração nordestina, que ocorreu a ocupação em massa e tornou-se a favela da Catacumba.O nome peculiar é devido a lenda sobre o território já ter funcionado com um cemitério indígena antes mesmo da colonização, entretanto, nunca foi achado qualquer vestígio que comprovasse de fato a utilização do local para esses fins. No ano de sua remoção, a favela da Catacumba contava com 6 mil habitantes que trabalhavam e desenvolviam atividades em seu entorno. Os moradores foram vítimas do projeto de “desfavelização” que tinha como objetivo revitalizar bairros nobres da cidade do Rio de Janeiro afastando a classe trabalhadora e extinguindo qualquer sinal de pobreza. Sendo assim, após a remoção os moradores eram direcionados para bairros distantes e alocados em conjuntos habitacionais como Cidade de Deus, Nova Holanda e Vila Aliança.Com um discurso higienista e de progresso, os moradores eram recolocados em áreas periféricas distantes do seu local de trabalho e em casas financiadas que possuíam muitas vezes problemas estruturais. Para compreender esse processo violento é necessário visualizar o espaço urbano como um local onde os conflitos sociais também se materializam, deste modo, sua dominação e transformações são engendradas por disputas políticas e ideológicas. A favela mesmo sendo essencial para a economia da cidade e para o funcionamento do capitalismo tenciona o espaço urbano, ainda mais quando se encontra em áreas nobres. Para solucionar essa contradição e valorizar ainda mais determinados locais o Estado endossa políticas de remoções, entretanto, justifica a prática usando de um discurso moralista e social que traduz-se na busca pela da ordem e segurança dos moradores de determinada favela.Não há a criação de políticas públicas, como a garantia de saneamento básico e contenção de encostas, é mais fácil retirar a classe trabalhadora e lucrar com isso. O morro do Catacumba é um exemplo deste processo, sua remoção foi impulsionada por sucessivos incêndios na região e deslizamentos. Os moradores foram completamente removidos e no início da década de 70 já não havia mais sinal de ocupação, o terreno foi reflorestado e os moradores direcionados para conjuntos habitacionais que logo tornariam-se novas favelas. Em uma reportagem do jornal do “O Globo” os moradores pareciam divididos: metade via a mudança como positiva e a outra estava preocupada por se afastar tanto do local de trabalho.O objetivo da “ desfavelização” foi alcançado: o processo de gentrificação ocorreu e a favela transformou-se em parque ecológico e local de turismo valorizando ainda mais o bairro da Lagoa.

AS MUDANÇAS NO ESPAÇO URBANO CARIOCA EM 2016


O histórico de reformas urbanas na cidade do Rio de Janeiro é longo e profundamente violento. Remontando as transformações empreendidas por Pereira Passos no início do Século XX, até as grandes obras para os Jogos Olímpicos de 2016, as mudanças no espaço urbano carioca sempre tiveram como efeito nefasto as remoções de comunidades inteiras, afetando centenas de milhares de pessoas ao longo de mais de um século. Os mecanismos que buscaram justificar as ações de despejo passavam pelo discurso da modernização da cidade, que tinha nas favelas e nos espaços habitados pela classe trabalhadora um entrave. Em todos os casos o resultado foi uma clara elitização da cidade, com um saldo de grande violência para os afetados.O projeto do Rio de Janeiro como cidade olímpica buscava naturalizar as remoções a partir do apagamento dos processos de despejo das décadas anteriores como na Favela da Catacumba. As obras para os Jogos Olímpicos foram usadas como pretexto para novas remoções, expulsando moradores de regiões centrais e historicamente mais ricas como a Zona Sul e a Grande Tijuca, mas também de regiões da Zona Oeste onde os locais de provas olímpicas e as obras de mobilidade urbana fortaleceram um processo de valorização imobiliária. O resultado foi o afastamento de populações mais pobres de regiões mais ricas da cidade, ampliado um processo de segregação sócio-espacial na cidade, mecanismo semelhante ao da Reforma de Pereira Passos, que criou o Centro da cidade como um espaço da elite da época.A simbologia também foi um fator importante para reforçar ainda mais a violência sofrida pelas famílias removidas. Neste sentido, as marcações feitas nas paredes das casas que seriam demolidas, com a sigla da Secretaria Municipal de Habitação ganharam destaque. O “SMH” se tornou a principal marca das remoções no Rio de Janeiro olímpico. O impacto dessa simbologia foi tão forte que gerou comparações com o Período Joanino, quando as casas marcadas com PR (Príncipe Regente) deveriam ser desocupadas para a utilização da Corte recém-chegada ao Rio.
Assim como em todos os processos de remoção da história da cidade, os despejos dos jogos olímpicos não passaram incólumes, sendo ponto de partida para resistência de diversas comunidades, se destacando a Vila Autódromo

MEMÓRIA NÃO SE REMOVE


Como já foi apontado anteriormente, as grandes expropriações de moradores de baixa renda em direção a áreas periféricas foram levadas a cabo por um projeto que buscava a gentrificação de zonas centrais e áreas abastadas, em uma comunhão entre estado e mercado. Essas remoções sempre se dão através de violência, seja ela física, ou simbólica e sempre representam um projeto memorial. Na Reforma Pereira Passos houve o apagamento da memória escravista da cidade do Rio, soterrando o Cais do Valongo e expulsando grandes massas de população negra, e um enorme contingente de descendentes de escravizados. Durante as obras para a Copa de 2014 e para as Olimpíadas de 2016 buscou-se apagar a memória daqueles que viviam nas regiões onde se objetivava construir vias de transporte, parques esportivos ou conjuntos habitacionais, mas qual memória eles estavam apagando? A memória de famílias pobres, a cidade moderna e cosmopolita que se pintava para o exterior não combinava com a realidade daquelas famílias cariocas, a falta de estrutura não valoriza empreendimento e famílias pobres não compram os imóveis de luxo a serem construídos.Em um projeto imposto com pouco ou nenhum diálogo botou abaixo casas, bairros sucumbiram e com eles histórias. Paredes que resguardavam lembranças e espaços onde ocorriam interações sociais e lazer se tornaram escombros. Com isso locais onde haviam conexões se tornaram não-lugares.
O não-lugar é esse espaço, sem laços, sem raízes, os quais não há uma ligação emocional com ele. Quando meu professor de História Antiga em 2016 falou com a minha turma sobre o não lugar ele deu o exemplo de uma ponte e de uma estrada, acredito que trazer o não lugar aqui “caia muito bem” uma vez que muitas dessas famílias perderam seus lares para dar lugar a transolímpica ou a transbrasil. Hoje anos depois o Parque Olímpico se encontra entregue ao abandono e imóveis vazios permeiam a paisagem do Rio Olimpico.
Para essas pessoas não é mais possível se reconhecer nesse local, a cidade não possui mais a familiaridade que elas viam antes, eles já não se sentem mais em casa. E se Walter Benjamin já aponta que cada vez mais o lar se torna mais relevante em nossa modernidade por ser o espaço onde imprimimos parte de nossa identidade e o local onde temos nossa maior familiaridade, até o direito a isso essas mais de 77.000 pessoas perderam.
O projeto de uma cidade a ser comerciada apaga comunidades inteiras física e simbolicamente, tentando ocultar os elementos que o mercado não julga merecedores de evidência, mas há resistência e a memória desses locais e dessas pessoas não podem ser apagadas, abaixo o museu das remoções estará linkado, visitem. Recomendo especialmente os documentários.

**A ORIGEM DO JOGO DO BICHO **


O Jogo do Bicho surgiu como uma “ação de marketing” do Jardim Zoológico de Vila Isabel. Para aumentar o público, o Barão de Drummond, então dono do Zoológico criou um sorteio: o jardim escolhia antecipadamente o animal daquele dia. O visitante ao entrar recebia sua entrada que servia como uma cartela, onde devia escolher um dos 25 animais. Ao final do dia era revelado o animal e os ganhadores recebiam seus prêmios em dinheiro. O jogo ficou tão popular que tomou as ruas. O sorteio passou a ser diretamente pelos números, enquanto os animais passaram a ser identificados com conjuntos de números. O jogo do Bicho passou a ser uma atividade econômica corriqueira, que não diminuiu de importância nem com a proibição dos jogos de azar na Década de 1940.Donos das bancas de apostas, os bicheiros eram figuras proeminentes na sociedade mantendo relações nos bairros onde se localizavam seus negócios. O principal símbolo destas relações é a ligação dos bicheiros com as escolas de samba, representada por Natal da Portela. O bicheiro se estabeleceu como patrono da escola de Oswaldo Cruz e Madureira financiando diversos carnavais da agremiação, levando-a a um período sem igual de vitórias nas décadas de 1940, 1950, 1960. A importância de Natal para a Portela foi tão grande que após sua morte em 1975 ele foi escolhido como presidente de honra da azul e branco.A imagem de Natal se cristalizou como o último dos bicheiros de uma época romântica do Jogo do Bicho. A partir dos anos 1970 houveram transformações no Jogo que mudaram a visão da sociedade sobre os bicheiros. Movimentando cada vez mais dinheiro, o Bicho passou a suscitar disputas cada vez mais violentas. A estrutura ilegal da contravenção era acobertada pela Ditadura Militar, com quem os bicheiros tinham forte relação, Embora continuasse a financiar os desfiles das escolas de samba e tendo os bicheiros como figuras reconhecidas pela imprensa e sociedade circulando em diversos espaços, o Jogo do Bicho passa a ser identificado como uma atividade criminosa que envolvia a violência. Esta ideia se consolida com a condenação de diversos contraventores em julgamento em 1993. Apesar disso a relação do Bicho com o carnaval segue forte até hoje, sendo o Jogo amplamente praticado a luz do dia e com amplas referências na cultura popular

**ILEGAL?: A PROIBIÇÃO DO JOGO DO BICHO **


Dando continuidade as nossas postagens sobre o jogo do bicho, é chegado o momento de abordarmos suas proibições, ocorridas em 1894, 1941 e 1946. Apesar dos diferentes anos de sua ocorrência elas guardam suas semelhanças.Pela ordem cronológica, a primeira a ser apontada é a de 1894, realizada pelo poder municipal do Rio de Janeiro. Naquele tempo o jogo do bicho teve uma explosiva difusão pela capital federal, com uma popularização que fez com que o jogo do bicho rapidamente caisse no gosto do povo. A atividade já não era mais uma exclusividade do zoológico e bancas de promoção do jogo eram diversas e capilarizadas. Ocorrendo no espaço público sem controle, ou regulação governamental.
Se deparando com a situação a municipalidade não tardou em proibir o já popular jogo do bicho. Na época a atividade lotérica bem como o controle do espaço público era realizado através de concessões para grandes empresas, o jogo do bicho desafiava esse controle, uma vez que os muitos agentes promotores do jogo eram deificilmente controlados.
O jogo do bicho resistiu a Primeira Repúbica e chegou ao Estado Novo, apenas para se encontrar na ilegallidade novamente, quando em 1941 os jogos de azar foram novamente proibidos. O Brasil na década de 1940 estava envolto por uma valorização do traballho e a religiosidade católica não toleraria a legalidade da atividade que desvirtuaria os trabalhadores de sua disciplina profissional e dos valores cristãos. Mas vale mencionar, que apesar dos jogos de azar terem sido proibidos, o Estado concentiu com diversos empreendedore para a manutenção de cassinos e bingos, um exemplo foi o cassino do Copacabana Palace, que se manteve em atividade até 1946. Novamente o desejo pelo controle da atividade e a delimitação e administração dos jogos é encontrado por trás das medidas proibitivas.A última proibição e a que vigora até hoje é a de 1946, essa é a que possui o caráter conservador e moralista mais expressa, sendo facilmente lida na própria lei que proibe os jogos de azar, como na passagem a seguir:“Considerando que a tradição moral jurídica e religiosa do povo brasileiro e contrária à prática e à exploração e jogos de azar; considerando que, das exceções abertas à lei geral, decorreram abusos nocivos à moral e aos bons costumes;”Trecho removido do Decreto-Lei no 9215, de 30 de Abril de 1946 Com a proibição a atividade lotérica fica guardada exclusivamente nas mãos da União, que atribui concessões a empresas quando lhe prouvem. Todavia os jogos de azar, e no caso mais específico do nosso tema, o jogo do bicho resistem devido ao seu enraizamento popular, sendo ainda hoje algo corriqueiro

O JOGO DO BICHO E A DITADURA


Uma capitulo não muito comentado sobre a ditadura militar é sua relação direta com o jogo do bicho. Iniciado no Jardim Zoológico do barão de Drummond sem grandes pretensões, em Vila Isabel no ano de 1892, o jogo ganhou as ruas e com o passar do tempo infiltrou-se no Estado e se aliou a violência e a corrupção. Hoje o jogo do bicho é envolvido com máquinas caça-níqueis e é considerado uma organização criminosa, sobrevivendo sob a mira de investigações e escândalos envolvendo até mesmo o Superior Tribunal de Justiça. Como e quando aconteceu essa profissionalização do crime e o desenvolvimento de uma organização?Para compreender este processo é necessário investigar o período da ditadura militar. A não aceitação do fim do regime fez com que militares envolvidos na repressão migrassem para o jogo do bicho virando segurança de conceituados bicheiros ou levando a lógica da organização militar para os esquemas. O jogo do bicho tornou-se um refúgio e uma alternativa para aqueles que não aceitavam o fim da concentração do poder militar. Alia-se a este fator a falta de medidas punitivas com aqueles que construíram e sustentaram a violência e repressão do regime e puderam se associar livremente a outras atividades ilícitas. Deste modo, o jogo do bicho perde o seu caráter de bem cultural popular para tornar-se sinônimo de organizações criminosas.Os bicheiros construíram essa relação durante o regime militar ajudando a perseguir opositores do regime em contraposição o regime fazia vista grossa para irregularidades além de fornecer proteção. Com a redemocratização, os bicheiros incorporaram os militares e seus saberes sobre logística, organização da máquina do Estado, divisão do trabalho, hierarquia, investigação e espionagem. Essa união foi decisiva para o crime organizado brasileiro, pois possibilitou o seu aperfeiçoamento e constituiu a maior facção criminosa brasileira.Enquanto a população brasileira estava voltada para a construção da democracia e a vinda de novos tempos, militares se associavam ao jogo do bicho e davam início a um processo de aprimoramento do crime organizado. Dentro deste contexto podemos citar como exemplo o Capitão Guimarães que atuou na repressão do regime e também o torturador Paulo Malhães.

O JOGO DO BICHO E O CARNAVAL CARIOCA


A relação entre o jogo do bicho e o carnaval carioca se tornou especialmente íntima a partir de meados do século XX. O primeiro dos contraventores a adotar uma escola de samba para lhe ser patrono foi Natal da Portela, bicheiro que então dominava a região de Madureira e adjacências e desde a infância tinha laços com a escola. Foi sob a presença de Natal que a "Majestade do Samba" se desenvolveu como a maior campeã do carnaval.A partir dos anos 60, com uma nova geração tomando conta e desenvolvendo a prática do jogo do bicho somada a outras práticas criminosas, como o contrabando, o movimento de Natal junto a Portela seria inspiração para muitos outros. Estes, buscando estabelecer imagens públicas positivas, firmar seus domínios sobre as regiões onde tinham negócios e alcançar uma ponte com o poder público, entraram nas escolas de samba e as tomaram de assalto, ocupando suas esteuturas políticas e fazendo ali seus redutos. Esse movimento também foi responsável por uma injeção financeira nas escolas e a respectiva profissionalização comercial dos desfiles, sacramentada com a criação da Liga Independente das Escolas de Samba (LIESA) em 1984, liderada pelos grandes contraventores da cidade.Com muita esperteza, os bicheiros instrumentalizaram as escolas de samba politicamente a favor de seus interesses. Desfiles exaltando a Ditadura Militar aconteceram no auge do regime. Também houve, em 1976, desfile exaltando o próprio jogo do bicho ganhando o carnaval, feito pela Beija-Flor de Nilópolis: o famoso "Sonhar com Rei dá Leão". Ali também se estabeleceu um posto avançado de negociação com governadores e prefeitos do Rio. Alguns dos expoentes da relação entre bicheiros e escolas de samba são Castor de Andrade (com a Mocidade Independente de Padre Miguel, na Zona Oeste do Rio), Anísio Abraão David (com a Beija-Flor de Nilópolis e cuja família domina politicamente a cidade há seis décadas) e Luizinho Drummond (com a Imperatriz Leopoldinense, em Ramos, na Zona Norte)."Dirigentes poderosos criam tanta confusão e o samba vai perdendo a tradição"
Trecho de "E o samba... Sambou", realizado pela GRES São Clemente em 1990 e em 2019

**O CANGAÇO **


Durante o final do século XIX e o início do século XX o sertão nordestino seria palco de um dos mais impactantes fenômenos sociais da história brasileira. O Rememorizando desta semana buscará expor o contexto do cangaço e refletir as memórias construídas em torno do famoso grupo liderado por Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião.Em 1877 assolaria o sertão a ‘’Grande Seca’’ - que inspiraria Graciliano Ramos a escrever a obra ‘’Vidas Secas’’ - matando cerca de 400 mil pessoas e gerando um forte movimento de migração obrigatória. Nas décadas seguintes outras fortes secas ocorreriam, estabelecendo um cenário de miséria extrema e abandono social, propício para o fenômeno do banditismo.Soma-se a isso o declínio da importância econômica e política da região nordestina com a mudança da capital federal para o sudeste brasileiro. Ainda, havia expressiva concentração de terra protagonizada pelos coronéis.É neste contexto que surgem os grupos cangaceiros que atuariam com protagonismo no sertão nordestino. A palavra ‘’’cangaço’’ vem de ‘’canga’’, peça utilizada para carregar objetos em bois. O termo ’’Cangaceiro’’ era usado de forma pejorativa para se referir a camponeses que constantemente migravam em busca de melhores condições de vida. Os grupos se manteriam até o final da década de 30, quando o Estado Novo passa a considerá-los inimigos públicos e aumenta os esforços para conter o cangaço. O fim simbólico do fenômeno acontece em 28 de julho de 1938, com a captura e decapitação de Lampião e seu grupo.

DISPUTAS DE NARRATIVAS EM TORNO DE LAMPIÃO


Mesmo com o fim do cangaço, a disputa de narrativas em relação ao que esse movimento foi e representa permanece em voga até hoje. Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, como símbolo maior desse movimento, é a figura que mais suscita debates e disputas na produção da memória. Um fato incontestável é a importância que sua figura tem para o imaginário popular nordestino. No entanto, o caráter idealizado que acabou tomando é muito questionado, principalmente pela natureza criminosa do cangaço. Em meio a essa discussão, há aqueles que acreditam que seu caráter seja de natureza histórica, não necessariamente bom ou ruim.O resgate do cangaço como um local de memória surgiu no período de redemocratização brasileira, através de uma tendência de fazer emergir na narrativa histórica grupos marginalizados da história oficial. Nisso, surgiu uma visão idealizada do cangaço, como um grupo de vingadores do poder e mandonismo local, inimigos dos grandes proprietários e independentes do sistema vigente. Essa visão se apoia muito no conceito de banditismo social, a resistência de grupos sociais marginalizados à sua própria condição. Dessa forma, as ações fora da lei dos cangaceiros, como assaltos e assassinatos, não teriam um juízo de valor já que são respostas à opressão constante que vivem. Essa foi em grande parte a narrativa incorporada e disseminada, sobretudo no nordeste. O estilo de vida do cangaceiro, materializado na figura de lampião, foi representado e consagrado na literatura de cordel, nas novelas, filmes e livros.No entanto, existe uma contranarrativa que evidencia o caráter ilegal e criminoso das ações do cangaço. O uso de violência, assassinatos, assaltos e, sobretudo, a abrangência dos ataques, que não visavam somente os ricos proprietários e atingiam também as classes mais baixas. Esses elementos contribuem para a tentativa de cunhar o cangaço como um movimento criminoso e a figura de Lampião como um mero “bandido”. Essa visão desconsidera o contexto social em que o grupo está inserido e nega o impacto evidente das mazelas sociais vivenciadas.Lampião, hoje visto como uma metonímia do cangaço, é alvo dessas disputas que tentam cristalizar sua memória tanto como herói, quanto bandido. Nesse caso, assim como em qualquer outra narrativa histórica, devemos questionar o processo como um todo, procurar entender o contexto e os fatos que levaram ao acontecimento, sem negar seus diversos aspectos, mesmo que controversos e, principalmente, buscar compreender sua importância na História.

DISPUTAS DE NARRATIVAS EM TORNO DE MARIA BONITA


Maria Gomes de Oliveira, ou Maria de Déa, nasceu no dia 8 de março de 1911 em um povoado da Bahia. Filha de pequenos lavradores, foi obrigada a se casar com 15 anos mas as brigas eram constantes e o casamento não deu certo.Após sua separação, conheceu Lampião e a atração foi instantânea entre ambos. Maria Bonita, como foi apelidada pela imprensa após seu falecimento, se tornou a primeira cangaceira a fazer parte do bando, abrindo oportunidade para outros cangaceiros levarem suas mulheres nas jornadas.O revisionismo das narrativas sobre o cangaço acabou, algumas vezes, idealizando certos aspectos da trajetória da personagem que virou ícone da liberação das mulheres através das lendas perpetuadas pelo cordel e por poetas e memorialistas.Maria Bonita não era uma feminista, pois em sua trajetória não houve nenhuma ruptura com a dinâmica patriarcal e machista reinante no sertão nordestino. O papel das mulheres no movimento era o de zelar pelo marido, ser uma boa companheira e, em alguns casos, elas eram mesmo raptadas a força de suas famílias.No entanto, ela tinha uma personalidade forte e pode ser considerada uma grande “transgressora” de seu tempo pois optou por seguir com Lampião ao invés de continuar insatisfeita em um casamento tradicional infeliz, como muitas outras mulheres da época.

DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA


Na semana do 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra, o Rememorizando - assim como outras atividades do PET História-UFF - se volta para debater o tema. Nesse primeiro post, vamos abordar a origem do feriado, sua história e memória no cenário atual.A data foi instituída oficialmente como feriado nacional apenas em 2011, porém, já era reivindicada desde os anos 70. Isso porque, anteriormente, considerava-se o 13 de maio como data comemorativa, referente à abolição da escravatura, que não possuía legitimidade para representar a verdadeira liberdade e luta negra. Em 1978, com o nascimento do Movimento Negro Unificado, o 20 de novembro é elegido, pelo movimento, como o Dia da Consciência Negra.20 de novembro de 1695 é a data da morte de Zumbi dos Palmares, grande líder da resistência escrava e também do Quilombo dos Palmares, o maior quilombo da América Latina. Na concepção do Movimento Negro, a verdadeira resistência, luta e liberdade residia na organização de quilombos, não na aboição da escravidão, movimento político que deixou os ex-escravos totalmente desamparados e marginalizados.O Dia da Consciência Negra, apesar de feriado nacional, é facultativo aos municípios brasileiros e apenas 15% deles adotam o feriado. A verdadeira representatividade dessa data vem dos esforços do movimento negro com manifestações socio-culturais e educativas para manter viva a memória de luta e resistência escrava e também reivindicar direitos e justiça frente às desigualdades e discriminação que permanecem até hoje. 20 de novembro é história, memória e principalmente, luta e resistência negra.


MEMÓRIAS DE ZUMBI E DO QUILOMBO DOS PALMARES


Como citado no nosso último post, a data 20 de novembro - dia da consciência negra - marca a morte do líder do maior quilombo da América Latina: Zumbi dos Palmares, tema do #ReMemorizando de hoje.Nascido na capitania de Pernambuco, na região onde hoje se situa o estado de Alagoas, Zumbi dos Palmares foi o último líder da maior resistência quilombola da qual se tem registro na História brasileira. Especula-se que tenha chegado neste cargo devido às suas notáveis habilidades guerreiras. Zumbi tem como suas características mais citadas a rigidez no comando e seu ímpeto de resistência ante as fortes investidas da administração colonial.A figura de Zumbi, assim como o Quilombo de Palmares, tem sido alvo de recentes ataques revisionistas em torno de sua memória, principalmente após a publicação de um certo ‘’guia’’ sobre a História brasileira. Estes trabalhos entretanto não sustentam suas bases argumentativas com fontes confiáveis; ainda, possuem claras intenções políticas de diminuir movimentos negros de resistência. Destaca-se: não há nenhuma evidência científica de que Zumbi ou o Quilombo dos Palmares tenha tido escravos.Vale ressaltar que devido a se tratar de uma ameaça ao regime colonial escravista, a escassez de fontes é um problema real para os estudiosos do tema. Sendo assim, a maioria das fontes primárias que tratam sobre o Quilombo dos Palmares e de Zumbi são de períodos de crise e de contato com pessoas consideradas inimigas do quilombo. Desta forma, grande parte das representações que possuímos de Zumbi são imaginativas ou baseada em poucos relatos sobre algumas de suas características físicas.Durante algum tempo foi questionado se Zumbi de fato existiu ou era um cargo importante em Palmares. Hoje o consenso historiográfico aponta que Zumbi foi a maior figura de liderança no quilombo, e não apenas um posto.

O PAPEL DA FUNDAÇÃO DOS PALMARES


O post de hoje do Rememorizando aborda as recentes polêmicas envolvendo a Fundação Palmares e as tentativas de revisionismo da memória do Movimento Negro no Brasil.A Fundação Palmares é uma entidade pública brasileira, fundada em 22 agosto de 1988, vinculada ao Ministério da Cultura. Seu objetivo, segundo a Lei que a instituiu, é “promover e preservar os valores culturais, históricos, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira”.Desde a sua fundação, a Fundação foi presidida por integrantes do movimento negro. No entanto, o atual presidente Sérgio Camargo, nomeado no governo de Jair Bolsonaro, se tornou conhecido por suas posições polêmicas envolvendo o negacionismo da existência de rascismo no Brasil, críticas às ações afirmativas aos negros e tentativas de apagamento de lideranças negras históricas.No dia 13 de maio desse ano, data que marca a assinatura da Lei Áurea em 1888, Sérgio Camargo publicou artigos no site oficial da instituição atacando a figura de Zumbi, desqualificando-o como herói e afirmando ser a Princesa Isabel a verdadeira heroína.Os retrocessos do reconhecimento governamental das lutas e conquistas do movimento negro demonstram a necessidade de intensificar a resistência e o engajamento sobre o tema.

A HISTÓRIA DO SUS


O Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro foi criado no contexto do período da Redemocratização, após a Ditadura Militar, e regulamentado pelas Leis 8.080/90 e 8.142/90, que dispõe sobre a organização da saúde no país. Este projeto vinha sendo idealizado desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, a qual, dentre outras determinações, ditava a universalização do direito ao acesso à saúde garantido pelo Estado.Antes do SUS a saúde era responsabilidade do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), órgão ligado ao Ministério da Previdência Social. Dessa forma, apenas possuíam acesso aos serviços limitados de saúde os trabalhadores formais contribuintes da Previdência, determinando assim, a exclusão de muitos brasileiros não inseridos nesta realidade. Para essa parcela da população restava recorrer ao sistema privado, aos serviços municipais e estaduais segmentados ou às instituições filantrópicas.O SUS, portanto, representa uma conquista popular muito importante do campo social, já que, após sua instituição, a saúde passa a ser compreendida como um direito de qualquer cidadão brasileiro, não uma simples prestação de serviço, assim, devendo e podendo ser reivindicado. Defender o SUS é defender o direito de um sistema público e integrado de saúde de qualidade, sobretudo, à população de baixa renda que mais depende dele.

O MOVIMENTO DE OCUPAÇÕES ESTUDANTIS NO BRASIL


As ocupações escolares no Brasil, fizeram parte de uma das maiores manifestações secundaristas na história do movimento no país. O fenômeno foi precedido por uma grande onda de ocupações escolares no estado de São Paulo em 2015, motivadas pelo projeto da secretaria de educação do então governo de Geraldo Alckmin, que resultaria no fechamento de 94 escolas municipais para uma nova organização do sistema educacional.Já em 2016, começam a ser ocupadas as primeiras escolas em novembro. Uma série de decretos, emendas e projetos de terceirizações motivaram o movimento, sendo alguns desses: o decreto aprovado pelo governador Marconi Perillo (PSDB) em Goiás, que determinava que a secretária de Educação, Cultura e Esporte deveria selecionar uma série de instituições privadas interessadas na gestão de escolas públicas; a investigação do Ministério Público sobre o superfaturamento das merendas escolares em São Paulo; o projeto “Escola sem Partido”; a apresentação de projetos que concediam às "Organizações Sociais” participação no ensino público; a “PEC de Gastos”, apresentada pelo governo Michel Temer; a “Reforma do ensino médio”, MP também apresentada pelo governo Temer.
Além de melhorias na qualidade do ensino fornecido pelo Estado, incluindo de infraestrutura ao salário dos funcionários, os estudantes exigiam que a educação fosse desvinculada da agenda privada, se opondo à mercantilização do ensino, defendendo-o como direito universal.
Diante disso, mais de mil escolas foram ocupadas por estudantes em todo o país, e em sua maioria, se mantiveram e prosseguiram as atividades escolares com a ajuda de professores e de doações das vizinhanças. Mesmo que pouco noticiados pela mídia, a organização e sucesso do desempenho interno das escolas impressionou. Mas isso não impediu que grupos opositores às manifestações atacassem não apenas fisicamente mas também virtualmente o movimento, espalhando falsas informações a respeito de seu funcionamento. Além desses ataques, os estudantes também sofreram forte repressão policial. Por isso, o Rememorizando dessa semana falará sobre esse grande evento que a educação brasileira adentrou, e assim defenderemos sua memória.


Mas como os alunos ocuparam? Como adolescentes e pré-adolescentes coordenaram meses de ocupação?Ao contrário do que se noticiava nos grandes veículos de mídia, a estratégia organizacional dos estudantes se provou eficaz, criativa e fortemente ligada com verdadeiros princípios democráticos.A indignação dos estudantes frente às políticas públicas arbitrárias para o tema da Educação, tem sua primeira manifestação pelas redes sociais, que ajudaram os alunos e se organizarem em abaixo-assinados, passeatas, protestos e, por fim, nas ocupações dos prédios que abrigam as escolas. Ao longo desse período, articularam-se para promover aulas públicas nos bairros; mutirão de limpeza nos prédios; rodas de conversa; oficinas temáticas e atividades culturais; bloqueio estratégico das ruas e assembleias deliberativas.Sobre as características de atuação dos estudantes, Eduardo Girotto destaca: “autogestão, ação direta, apoio mútuo e solidariedade”. (GIROTTO,2016, p 1123-1125)
A capacidade de articulação dos adolescentes chamou a atenção de especialistas. No trabalho Escolas de Luta considera-se que:
"Poucas vezes, na história social recente, um movimento “soube utilizar espectro tão grande de táticas e se metamorfosear em tão curto espaço de tempo”, contar com o apoio e a simpatia da população e, sobretudo, forjar novas práticas sociais, uma nova sociabilidade no processo de luta, a ação coletiva autônoma e horizontal" (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2016, p. 15-16).
A rede de apoio em prol da mobilização estudantil contou também com a participação de pais e professores que se uniam aos protestos, assim como movimentos sindicais, partidários e movimento popular, também atuaram em parceria com os secundaristas.Pautas como a defesa de direitos LGBT+ e direitos das mulheres também atingiram protagonismo nas reivindicações estudantis. A despeito disso, os principais jornais não hesitaram em propagar informações falsas que relacionavam a atuação dos estudantes com vandalismo, desordem e depredação de patrimônio público.Essa movimentação da mídia visa reprimir a atuação popular, fazendo com que a opinião pública se converta contra as mobilizações e as julgue negativas para a sociedade. As ocupações intituladas pelos estudantes como Primavera Secundarista marcam a importância do movimento estudantil e a força do poder popular. São um exemplo de estratégia política e reforçam os valores democráticos de acesso a educação pública de qualidade, bem como o direito de reivindicação e de participação no processo de formulação de políticas públicas.Referências:CAMPOS, Antonia M.; MEDEIROS, Jonas; RIBEIRO, Márcio M. Escolas de luta. São Paulo: Veneta, 2016 (Coleção Baderna), 352p. Revista Espaço Acadêmico, 16(185), 158-159. Recuperado. Disponível em: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/33728.GIROTTO, Eduardo Donizeti. A dimensão espacial da escola pública: leituras sobre a reorganização da rede estadual de São Paulo. Educação & Sociedade, v. 37, n. 137, p. 1121-1141, 2016


O legado das ocupações estudantis Brasil à fora pode ser resumido em duas palavras: participação e autonomia. Quantas vezes já não ouvimos frases como "escola é lugar de fazer conta", "escola não é lugar disso", sempre que os alunos demonstram posicionamentos críticos, contrariando o papel de passividade que deles esperam? Por uma perspectiva freireana, as ocupações foram um enorme exemplo da luta por uma educação libertária em contraposição à educação bancária, conceitos tão caros à obra de Paulo Freire.Alunos secundaristas (adolescentes e pré-adolescentes) demandando que suas vozes sejam ouvidas e que participem diretamente nas decisões públicas que concernem o ensino, fazendo eco com as demandas do mundo para além dos muros da escola. Em um contexto onde a regra é a educação bancária, onde a escola é operada como uma bolha hermética separada da sociedade e uma fábrica produtora de trabalhadores obedientes, que não se devem se ocupar de questões como políticas públicas, educação, racismo, gênero, etc, movimentos como os ocupações são a antítese de tudo isto.Com as ocupações os estudantes afirmaram para todo o Brasil que, independente de sua tenra idade, são agentes sociais que desejam conscientemente ter sua voz ouvida e participar da vida pública e que rejeitam o papel passivo que tentam lhes imputar. Participação e autonomia do estudante, como uma educação libertadora deve ser.

CLARISSE LISPECTOR


No dia 10 de dezembro, foi completado o centenário de Clarice Lispector. Nascida na Ucrânia, antiga URSS, se mudou para o Brasil aos dois meses de idade, passando sua infância e adolescência em Recife. Em 1935, foi com a sua família para o Rio de Janeiro, onde sua mãe faleceu. Matriculou-se no Colégio Sílvio Leite, ingressando posteriormente na Faculdade de Direito.Em 1939, trabalhou como redatora na Agência Nacional e como tradutora e jornalista no jornal A Noite. Casando-se com um diplomata, Clarice viveu em muitos países, onde em 1952 viveu com seus dois filhos em Washington (EUA) por 8 anos. Se separou de seu marido em 1959, retornando de forma definitiva para o Brasil, com um dos filhos ficando com ela no RJ, enquanto o outro viveu em outro país com o pai, que se casou novamente.Clarice Lispector tem um amplo número de obras, desde contos, romances, literatura infantil, crônicas, uma novela, dentre outros. Desde os 7 anos já escrevia, e antes de publicar seu primeiro conto, a mesma já tinha escrito contos e histórias que acabavam sendo recusados por editoras, jornais e revistas. Em 1943 publicou seu primeiro romance “Perto do Coração Selvagem”, sendo premiado pela Fundação Graça Aranha, no ano de 1944. A literatura infantil iniciou quando seu filho de 5 anos pediu para que a mãe escrevesse uma história, a qual a partir deste ponto acabou escrevendo outros.Com um estilo literário inconfundível, Clarice enfoca em seus textos o ser humano, juntamente com suas angústias e questionamentos existenciais. O enredo se mostra quase sempre psicológico, onde a originalidade e a força de sua linguagem através da intensidade das emoções de seus personagens atingem o leitor, sendo impossível ficar indiferente as suas obras, marcando não só a literatura brasileira, mas também aqueles que se mostram abertos a desvendá-los e descobrir um pouco mais do ser humano.

**A VIDA DE PAULO FREIRE **


Paulo Reglus Neves Freire, o Patrono da Educação brasileira, foi um educador e filósofo brasileiro, nascido em Recife no dia 19 de setembro de 1921, onde em sua condição de criança passou por dificuldades de experimentação desde cedo a fome, necessário para que seus estudos prejudicados. Segundo seu filho, Lutgardes Freire, Paulo foi alfabetizado pelos seus pais debaixo de uma mangueira, escrevendo no chão com um graveto como primeiras de sua infância.
A educação recebida de seus pais era dialógica, uma educação de liberdade sem libertinagem (característica educacional mantida com seus filhos e filhas). Por conta da crise de 29 se mudou para outra cidade, final o curso primário em Jabotão, próximo a Recife. No entanto, aos 13 anos perdeu seu pai-tenente do exército- vítima de uma queda de cavalo em um desfile de 7 de setembro. Com isso, sua família voltou para Recife com uma pensão muito pequena, na busca incessante por uma escola para Paulo a qual oferecesse bolsa de estudos.
Ingressou na escola Oswaldo Cruz, e aos 21 anos de idade já atuava como o professor de Língua Portuguesa na mesma instituição. Em 1944, se casou com a professora Elza Maia Costa Oliveira, tendo 5 filhos. Após o momento de docência vivenciado por Paulo Freire, o mesmo se tornado diretor no setor de Educação e Cultura SESI, possuindo seu primeiro contato com operários e alfabetização de adultos. Em 1959 defendeu sua tese “Educação e Atualidade Brasileira”, obtendo o título de Doutor em Filosofia e História da Educação.Com o conhecido “método de Paulo Freire”, no contexto dos anos 60, este surgiu como um intelectual e educador, onde a partir disso poderia alfabetizar 5 milhões de adultos. Se posicionando como um educador progressista, Paulo começou a incomodar as dimensões mais conservadoras da sociedade, pois o seu método aumentaria o eleitorado político, fazendo com que essas “improvisações” provavelmente perdessem o seu espaço político. Com isso, na época do Golpe de 64, ficou preso por 72 dias, e após isso se tornado um exilado, sobretudo no Chile, possuindo muitos escritos publicados neste momento como a Pedagogia do Oprimido.Logo após, foi para Harvard trabalhando de forma mais acadêmica e teórica, mas foi em Genebra que se tornou mundialmente conhecido, trabalhando no Conselho Mundial das Igrejas, se consagrando como um educador e Filósofo da Educação. Com a Anistia, Paulo Freire voltou com sua família em 1980. Trabalhou como professor na PUC e na UNICAMP, produzindo vários trabalhos, assim como outros cargos. Paulo Freire foi o brasileiro mais homenageado da história, com no mínimo 35 títulos de Doutor Honoris Causa das universidades da Europa e da América. Morreu aos 75 anos, em 1997, como um dos maiores pensadores na história da pedagogia mundial, com grandiosos trabalhos para este âmbito, que devem ser valorizados e especiais.
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**A OBRA DE PAULO FREIRE E SEU PROJETO EDUCACIONAL **


Em 1963, Paulo Freire tem como incumbência alfabetizar um grupo de cortadores de cana no Rio Grande do Norte, nessa experiência ele capacitado para seu método de alfabetização e aprofunda sua metodologia de ensino. Com isso, ele conseguiu alfabetizar 300 agricultores em 45 dias.A partir disso, ele cria sua teoria que é baseada em uma forma de educar conectada ao cotidiano dos estudantes e às experiências que eles possuem, promovendo um diálogo entre o professor e aluno cursar o estudante em um aprendiz ativo e o professor em um mediador do processo . Ou seja, uma crítica ao ensino tradicional em que o docente seria o detentor de todo o conhecimento e a transmitiria aos discentes, que eram meros "depositórios", o que Freire chamou de "bancária educação".Seu método de alfabetização consistia em estimular a verbalização do cotidiano dos alunos através de palavras presentes na realidade deles. Era divido em três etapas: A investigação, em que por meio de uma conversa o educador reunia como principais palavras que os estudantes utilizam em seu cotidiano. A tematização, na qual há um debate sobre o que palavras representam, quais são seus significados sociais. E, por fim, a problematização, que estimula uma reflexão crítica acerca do mundo em que vivem.Portanto, Paulo Freire em sua obra "Pedagogia do oprimido" defende que educar é um ato político, que deve libertar os adeptos através da "consciência crítica, transformadora e diferencial que emerge da educação como uma prática de liberdade". A filosofia educativa de Freire é a educação transformadora, crítica da educação reprodutiva, que busca reinventar o ato de educar, questionando e subvertendo como hierarquias e desigualdades sociais.Sua referência é referência na área de educação, sendo aplicada em diversos países como: Finlândia, Inglaterra, Canadá, Holanda, Alemanha, Portugal, Suécia, Áustria, África do Sul, Kosovo e em alguns estados dos EUA. Ele é ainda o terceiro pensador mais citado em trabalhos acadêmicos no mundo inteiro.Nesse sentido, conhecer sua obra é essencial para evitar a desinformação e a disseminação de notícias falsas que promovem o ódio e sua imagem.
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OS ATAQUES A PAULO FREIRE E A AMEAÇA À EDUCAÇÃO BRASILEIRA


Ao longo dos últimos anos, com a intensificação da crise política no Brasil, a imagem de Paulo Freire vem sendo ferrenhamente atacada por setores do campo político da direita e, mais intensamente, pela extrema-direita, com extenso uso de mentiras contendo informações falsas, deturpações de seu projeto e promoção à posição ideológica desse que é considerado o Patrono da educação brasileira. Alguns dos supostos intelectuais que capitaneiam esse movimento são notáveis por propagar outras tantas mentiras e semear o negacionismo em todo tema que abordam.Ataques a Paulo Freire taxando-o como um inimigo ocorrido desde a história do século XX; em tempos conturbados dos anos 60, de acordo com o próprio Freire ele era constantemente taxado como "inimigo de Deus e da pátria". Esses resultados a esta importante figura e suas contribuições tem um claro objetivo político de ataque à transformação social por meio da educação e aos métodos educacionais que buscam a inclusão e a formação do pensamento crítico. Em suma, é reconhecível nesse movimento de ataque uma lógica de manutenção das elites no poder e na detenção de conhecimento, aplicando inclusive uma inversão taxativa que alega que o método de Freire seria supostamente excludente e preconceituoso, acusação sem bases plausíveis.A escalada de extrema direita, encampada por um movimento reacionário intenso no Brasil na última década, promoveu diversos processos ao projeto de educação crítica que promova e impulsione a reflexão social peloos aprendizes. Movimentos como o "Escola Sem Partido" e outros tantos de ataque ao ensino público, incluindo correção de privatização, buscaram diretamente propagar pelas redes sociais mentiras e avanços descabidos ao filósofo e pedagogo que tanto colaborou para a educação brasileira e mundial. O legado de Paulo Freire está sob ameaça e precisa ser urgentemente defendido.

MARIGHELLA: O FILME


O filme “Marighella”, uma direção de Wagner Moura, lançado no ano de 2019 em Berlim e em 2020 no Brasil, foi criado a partir de uma adaptação feita da biografia “Marighella, O Guerrilheiro que Incendiou o Mundo”, de Mário Magalhães. O filme conta com diversos atores muito conhecidos da teledramaturgia brasileira, como: Adriana Esteves, Bruno Gagliasso, Humberto Carrão e Seu Jorge como protagonista.Retratando o ano de 1969, o filme aborda sobre a história de Carlos Marighella, que como vimos até aqui foi um organizador da armada de luta contra uma ditadura militar brasileira. A figura de Marighella divide muitas opiniões e com o filme não seria diferente. Nas próprias gravações e lançamento do filme apresentado a existir muitos problemas, não só em relação ao adiamento do filme de novembro de 2019 para maio de 2020, onde o diretor classificou como “censura”, com conflitos entre os produtores e a Ancine, mas também pela acentuada reação de dependência com relação ao seu envolvimento com o filme, apesar de seu claro posicionamento como uma pessoa de esquerda. Wagner trata sobre o ódio gerado nas gravações, com diversas categorias de avaliação que são contra seus posicionamentos e ao que o filme representa.Como exposto, primeiro foi lançado em Berlim por conta de tais problemáticas, o qual possuiu uma gama de críticas. Um dos exemplos é o caso do rbb, uma estação de rádio de Berlim, que apontou uma mitificação no filme em forma de uma “Epopéia cansativa”. No Brasil, houve uma enxurrada de manifestações contra o filme, mas que claramente representam a política e governo atual. O IMDb, uma base de dados online de música, filmes, dentre outros, precisa apagar as classificações do filme que se encontravam com a média em 2,8 / 10 após uma mobilização dos apoiadores do presidente atual que se mobilizaram para que o filme possuísse notas negativas, moderadas uma plataforma de alcance internacional.Evidentemente as posições do filme não giram apenas em torno do que foi visto, mas que denotam claramente a situação atual e as manifestações em torno da figura de Marighella, o que ainda depois de décadas gera toda essa divisão de pensamentos diante de seus feitos.

LEI ANTIFUMO


Nas semanas últimas o vídeo onde entrevistadores do programa '' Roda Viva '' questionam o então prefeito da cidade de São Paulo, Paulo Maluf, a respeito da proibição do cigarro em locais fechados se tornados viral. O que hoje é uma cena cômica, foi por décadas uma guerra envolvendo cientistas, Estado, mídia e a indústria do tabaco. O último #ReMemorizando do ano tratará das disputas em torno das imposições de medidas restritivas ao cigarro.Na década de 50 trabalhos científicos que apontavam a ligação direta do uso contínuo do tabaco com o câncer de pulmão nos Estados Unidos impactaram a sociedade americana. A resposta da indústria do tabaco após observar a diminuição da compra de seu produto foi imediata: as grandes agências públicas foram contratadas com o objetivo de forjar uma mensagem positiva do cigarro. A estratégia era clara, se questionavam as evidências dos estudos para proporcionar uma ilusão de que o debate ainda estava em aberto e mostravam como fumar era sinônimo de jovialidade e estilo.Na década de 80 como primeiras medidas restritivas ao produto começado a ser implementadas no Brasil. Na época, de acordo com a Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN), o número de locais brasileiros era de 34%, o que inevitavelmente significou resistência contra as '' exageradas medidas '' que proibiam o uso do cigarro em locais fechados como aviões e bares. Uma grande parte dessa disputa inicial se travou na área pública, onde os esforços do governo estavam concentrados em apontar para o caráter de dependência química que os usuários se encontravam, além do grande risco de desenvolvimento de sepulturas doenças - não só para os ativos ativos mas também para os passivos.No ano 2000 a indústria do tabaco no Brasil sofreu sua maior derrota com uma proibição de propaganda de seu produto nos principais meios de comunicação. Desta forma, tornada-se possível a veiculação de materiais que apontassem para os machos do cigarro, antes omitidas pelos canais dados à injeção monetária da indústria.Apesar da estratégia da indústria, que atrasou por décadas a imposição da Lei Antifumo, em 2013 o percentual de adultos indefinidos no Brasil era de 14,7%, representando uma queda de aproximadamente 19 pontos percentuais. Ainda, uma pesquisa do INCA aponta que a proibição de cigarro em locais públicos evitou a morte de 15 mil crianças no país.